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Déficit de inteligência
Queda na produção de doutores exige esforço de autoridades federais e estaduais para reativar a busca por qualificação
UM ENIGMA ronda o sistema de pós-graduação no Brasil: por que
caiu, a partir de 2004,
o ritmo de aumento na formação
de doutores? Nos primeiros anos
da década, o número de teses de
doutorado defendidas a cada ano
crescia à taxa de 15%. Desde então, a média diminuiu para 6%,
como revelou reportagem de
Eduardo Geraque nesta Folha.
Em 2008, foram aprovados
10.711 novos doutores. Há duas
décadas, esse número não passava de mil. Com a queda no ritmo,
contudo, torna-se pouco provável alcançar a meta do Plano Nacional de Pós-Graduação de concluir 16 mil doutorados em 2010.
Apesar do esforço de qualificação acadêmica, a proporção de
doutores por grupo de mil habitantes no Brasil segue medíocre:
0,6. Na Alemanha, por exemplo,
são 30. Mesmo não figurando
como único fator contribuinte, o
nível geral de escolaridade contribui de modo decisivo para a
capacidade de inovação do país.
Em 1989, o Brasil produzia o
equivalente a 3% dos doutorados dos Estados Unidos. Essa
proporção subiu até bater em
20% em 2003. Desde então, encontra-se estacionada.
Tal paralisia mantém o país
em posição de desvantagem
competitiva no mercado mundializado de produtos e serviços
de alta tecnologia e maior valor
agregado. A China, com PIB per
capita 40% inferior, mas dez vezes mais pesquisadores em números absolutos, vende-nos eletroeletrônicos e compra produtos primários. O superávit a seu
favor foi de US$ 3,6 bilhões no
ano passado.
É provável que vários fatores
concorram para a queda na taxa
de produção de doutores, mas
ainda não está claro quais e com
que peso. Entre dirigentes de
instituições de pesquisa paulistas corre a interpretação de que
a raiz do fenômeno esteja na diminuição proporcional de verbas federais para o Estado, onde
se concentra a pesquisa mais
produtiva do país.
Se, há 15 anos, metade das verbas de fomento de órgãos como
Capes e CNPq fluía para São
Paulo, hoje a fatia está abaixo de
um terço. Formavam-se então
nas universidades paulistas dois
terços dos doutores do país, proporção reduzida a dois quintos.
Não é possível afirmar com segurança, porém, que esta seja a
principal razão da desaceleração. Além disso, a disseminação
da pesquisa por todo o território
é objetivo legítimo e desejável da
política científica e tecnológica.
Cabe investigar se o sistema de
pós-graduação como um todo
não se encontra saturado. O número de programas e vagas sofreu uma pequena explosão, mas
não o de orientadores qualificados e credenciados, que foi de 32
mil a 35 mil desde 2003.
O enigma está aí para ser decifrado. Em lugar de entregar-se a
uma contraproducente disputa
com motivação político-partidária, autoridades federais e paulistas do setor deveriam unir esforços para diagnosticar e reverter a tendência decrescente.
Nenhum dos lados detém
meios suficientes para produzir
toda a inteligência de que o país
necessita.
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