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MARINA SILVA
Síndrome de
Poliana
ACUMULAM-SE AS evidências de que a ação humana
está mudando o clima da
Terra em velocidade maior do que
se pensava, acelerando a transformação de todos os ecossistemas.
Foi o que me disse há alguns dias
Carlos Nobre, respeitado especialista em climatologia, pesquisador
do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe) e membro do
IPCC, o Painel de Mudanças Climáticas da ONU. Ele falava do encontro de cientistas de todo o mundo em Copenhague, na Dinamarca,
numa reunião preparatória para a
Conferência do Clima (COP-15),
que acontecerá lá mesmo, em dezembro deste ano.
Segundo Nobre, as previsões estão sendo, infelizmente, revistas
para pior. O mundo terá que tomar
medidas enérgicas para conter o
aquecimento global, cuja face mais
visível é o derretimento crescente
da cobertura de gelo do Ártico, no
Polo Norte. A tendência é que ela
se derreta completamente. "Isso é
muito sério, e terá reflexos no clima de todo o planeta e em toda a
biologia marinha", disse ele. "Antes, a previsão era de que isso poderia acontecer no ano 2100. Agora
já se pensa em algo como 2030 a
2050".
Que no fim do século 21 a Terra
será mais quente não há mais dúvidas. A questão, alerta Nobre, é de
quanto será essa alteração. Há uma
previsão de aumento médio da
temperatura entre 1,8C e 4,5C.
Acima de 2C já poderá ser catastrófico, mas muitos, numa atitude
que poderíamos chamar de síndrome de Poliana, preferem pensar
que o aumento será de apenas
1,8C e tudo terminará bem. No entanto, ninguém pode garantir que
não chegará a 4,5C. A hora é
de precaução, o que significa reduzir drasticamente as emissões de
carbono.
No encontro de Copenhague,
chegou-se a falar em corte, até
2050, de 100% nas emissões dos
países ricos. Na média global, essa
"descarbonização", como chamam
os cientistas, terá que chegar a 80%
em meados do século. Para isso,
países em desenvolvimento terão
que reduzir as suas emissões entre
70% e 75%.
Percentuais à parte, o Brasil não
pode se eximir de fazer o seu papel.
Nesse quesito, Poliana precisa ser
avisada de que nem tudo vai bem.
Hoje o país faz a sua lição de casa
incompleta e sem a necessária persistência. Volta atrás em caminhos
penosamente percorridos e abre o
flanco a riscos enormes de aumentar desmatamentos -nossa maior
fonte de emissão de gases do efeito
estufa-, e o Estado não induz a
uma cultura de sustentabilidade.
Acorde, Poliana! A situação é
grave, e hoje em dia não basta o
pensamento positivo. Ele ajuda
muito, mas apenas quando somado
à coerência e à ação.
contatomarinasilva@uol.com.br
MARINA SILVA escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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