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BORIS FAUSTO
A Copa vista de longe
Cometi um pecado grave, pelo
qual me penitencio: pela primeira
vez na vida, acompanhei a Copa fora
do Brasil. Explico, mas não justifico.
Combinei uma viagem em março,
quando tudo andava mal e só "quem
não entendia de futebol" acreditava,
por razões de fé, na seleção brasileira.
Alguém poderia dizer que, salvo os
poucos que foram à Coréia e ao Japão,
todos nós vimos a Copa de longe. Mas
não é bem assim. A distância não é
geográfica. Viu de perto quem participou da ansiedade de milhões, à espera
da madrugada, quem soltou rojões ou
os acompanhou com entusiasmo,
quem ouviu os mil comentários do
Casagrande, Júnior, Rivelino etc. e até
quem se embalou na voz do Galvão
Bueno.
Perdi tudo isso, tanto mais que fui
para um país estranho, em que o jogo
de uns grandalhões, batendo numa
bolinha com um bastão e correndo de
um lado para outro, desperta enorme
entusiasmo. No silêncio absoluto do
fim dos jogos, tinha vontade de ir de
porta em porta e gritar "o Brasil ganhou", como é que vocês nem se dão
conta disso?
Mas é possível extrair algumas vantagens de ver tudo por meio de um
olhar distante. Os locutores que transmitiam os jogos em espanhol -muito simpáticos, dizendo que tratariam
de manter a objetividade, mas que
simpatizavam com os brasileiros- fizeram belas confusões, chamando indiferentemente a seleção de equipe
brasileira, verde e amarela ou carioca.
Não faltaram também os arroubos
metafóricos, não fossem eles mexicanos, do gênero "viene el ataque de
Brasil con ímpeto amazónico".
Na imprensa americana, destacaram-se uns poucos comentaristas esportivos fanáticos por futebol, com a
paixão característica daqueles que
aderiram a uma seita minoritária. Vocês já imaginaram alguém, aqui no
Brasil, propondo-se a explicar por que
o futebol é o esporte coletivo mais belo
do mundo? Seria como explicar que
quem não aspira o ar, morre.
Pois esses bravos comentaristas se
dedicaram à tarefa, arrasando a maioria que critica o futebol por ser um jogo em que, salvo o goleiro, não se pode
usar as mãos, típico exemplo de preconceito anatômico. Disseram ainda
que quem acha complicada a regra do
impedimento, embora entenda perfeitamente as regras do beisebol e do
futebol americano, sofre de bloqueio
mental. Lamentaram ainda a estreiteza daqueles que nunca sentiram o prazer de aguardar, no peito e na garganta, a explosão de um gol raro, prazer
infinitamente maior do que o de festejar uma sucessão de cestas.
Nas páginas esportivas dos jornais, o
futebol acabou ganhando algum destaque e, como tudo era fornecido com
parcimônia, as imagens ganharam
maior impacto. Por exemplo, passei
vários minutos olhando uma foto do
Ronaldo, que parecia voar para a glória, nos ombros do Vampeta. E foi
bom ler a saga do Ronaldo -quase
transformada em novela à margem do
título-, os elogios à qualidade dos jogadores e à capacidade organizatória
do Big Phil. Big Phil? Pois é, naturalmente, o Felipão.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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