São Paulo, terça-feira, 15 de julho de 2008 |
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CLÓVIS ROSSI O inimaginável acontece
SÃO PAULO - À primeira vista, parece perfeita a análise do procurador federal Jorge Luís de Camargo,
publicada ontem pelo "Painel do
Leitor" desta Folha, obviamente
sobre o caso Daniel Dantas. Diz o
procurador que se trata de "exemplo perfeito de plena democracia e
funcionamento das instituições e
dos Poderes do país, pois o banqueiro foi preso e solto duas vezes
por ordens judiciais dadas por juízes independentes, que agiram
conforme suas convicções e amparados, cada um com sua interpretação, na Constituição federal."
Se você olhar para trás, ótimo. Há
uns 30 anos, pouco mais ou menos,
prendia-se gente clandestinamente
(e não se soltava). Não se usavam
algemas apenas, mas "pau-de-arara" e outros instrumentos medievais. Não havia espetáculo, como
agora, mas tampouco havia lei. Melhoramos em algo, pois.
O problema vem na frase seguinte, nas "convicções" e "interpretações" de cada autoridade judicial,
amparadas na mesma Constituição. Que deva haver margem para
interpretação, parece indiscutível.
Mas começa a ser tremendamente
inquietante que a margem seja tão
elástica a ponto de abrir um confronto não apenas entre integrantes do Judiciário, mas entre parte
destes e parte do Executivo.
Bem feitas as contas, há, nessa
margem, um grau de arbítrio, "pau-de-arara" à parte, que guarda remoto parentesco com os velhos tempos. Se tudo não passa de convicções e interpretações, em vez da letra clara e límpida da lei, ficam os
cidadãos à mercê de tribunais que,
como diz o notável jurista que é
Paulo Brossard, "não são formados
nem de santos nem de sábios". Se
não são, melhor seriam códigos que
limitassem ao máximo a margem
de interpretação.
Do jeito que está, torna-se aterradora outra frase de Brossard na
entrevista ontem publicada pela
Folha: "Cumprir a lei se tornou
quase uma coisa inimaginável".
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