São Paulo, quarta-feira, 15 de julho de 2009

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Petróleo em partilha

Gestão Lula não elucida dúvidas cruciais de seu modelo para o pré-sal, projeto que correrá risco político no Congresso

O PALÁCIO do Planalto, numa repisada tática de contrapropaganda, tentou distrair a atenção da opinião pública da CPI da Petrobras, instalada ontem, com o anúncio de um "fato positivo" na área do petróleo. Encontrou às pressas um meio de divulgar o modelo exploratório proposto pelo Executivo para a vasta província do chamado pré-sal.
Há um ano uma comissão do governo debate como tratar, do ponto de vista fiscal e econômico, a promissora área que dista 300 km da costa, estende-se do Espírito Santo a Santa Catarina e cuja exploração requer perfurações de até 8.000 metros em solo oceânico. A intenção era só produzir cortina de fumaça, pois nenhuma novidade foi divulgada.
O governo confirmou sua proposta já conhecida: pretende criar uma estatal para gerir os novos campos e adotar, ali, um modelo denominado partilha de produção. Nenhuma definição foi divulgada acerca do que mais importa: que parcela da riqueza extraída ficará com o Estado e como esses recursos públicos serão aplicados.
Há tanta variação de modelos de exploração no mundo que é impossível dizer qual o mais adequado ao Brasil. Desde que o país defina o essencial, como o nível de taxação, é possível atingir o objetivo por mais de uma via. Por isso alguns especialistas argumentam que o formato atual, baseado em concessões de áreas para o grupo empresarial que fizer a maior oferta no leilão, deveria ser mantido -com ajustes que aumentem a fatia recolhida ao governo, a título de royalties e participações especiais.
A administração Lula optou por uma mudança maior. A partilha de produção se assemelha, no conceito, aos tradicionais contratos agrícolas em que o dono da terra a cede a um agricultor e este, por sua vez, se obriga a dividir a produção agrícola com o proprietário. No caso do petróleo, o "dono da terra" é a União, e o "agricultor" é a empresa escolhida para explorar o poço.
Há uma ligeira vantagem teórica nesse modelo para países que possuem grandes reservas. Ele permite que o governo nacional dose com mais autonomia o fluxo da exploração e da venda do petróleo. Não se pode ignorar que grandes reservas do combustível fóssil despertam cobiça internacional; é prudente, portanto, que o país mantenha algum tipo de controle de oferta e se defenda, contratualmente, de possíveis ações predatórias.
A tentativa de apropriar-se dessa vantagem teórica, contudo, pode implicar, no caso brasileiro, custos muito altos. A opção tomada pelo governo Lula requer mudanças importantes na legislação, o que depende de negociações duríssimas no Congresso. Infelizmente, nossos parlamentares, salvo exceções de praxe, tendem a vislumbrar nessa tramitação um grande butim -os recursos extraordinários do pré-sal-, a ser esquartejado e destinado a fins estapafúrdios.
O Brasil não deveria imitar nações que afogam seu futuro no petróleo abundante do presente. É preciso assegurar hoje que o dinheiro do petróleo ajude a modernizar o país -para que se torne mais rico, justo e produtivo mesmo quando os poços do pré-sal estiverem exauridos.


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