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DEMÉTRIO MAGNOLI
A camarilha
No tumultuoso ano de 1992,
sob o impacto das mobilizações
que conduziriam à renúncia de Fernando Collor, encontram-se as raízes
da camarilha que hoje controla o PT.
O grito de "Fora Collor!" surgiu entre
as bases petistas, à revelia de Lula, que
procurou inicialmente contê-lo, e provocou uma dissidência na Articulação, a corrente dirigente do PT. No
ano seguinte, pela primeira vez, essa
corrente perdeu o controle sobre o Diretório Nacional do partido. Nas eleições presidenciais de 1994, o candidato Lula montou uma coordenação paralela e informal de campanha, contornando a linha política definida nas
reuniões da coordenação oficial.
FHC foi eleito no rastro do Plano
Real, mas Lula interpretou a derrota,
de modo simplista e egocêntrico, como um produto da força do poder
econômico e do "radicalismo do PT".
Dedicou seus esforços, então, à construção de uma nova maioria no PT e,
no fim das contas, de um novo partido. O Campo Majoritário surgiu em
1995, reunindo a antiga Articulação à
corrente liderada por José Genoino e
agregando políticos de expressão própria. A nova maioria não tinha idéias,
exceto aquela expressa no seu nome:
formar uma maioria eterna, intocável.
Mas tinha um plano de ação: combater o programa original do PT e a sua
identidade de partido democrático e
militante.
José Dirceu, o operador de Lula e
presidente petista ungido pelo Campo
Majoritário, executaria a desfiguração, criando um "partido da ordem" e
uma máquina partidária profissional.
Em nome da meta obsessiva de conduzir Lula à Presidência, Dirceu assumiu a missão de tecer a rede de uma
camarilha política que asfixiou o PT e,
já como quadrilha de delinqüentes, viria mais tarde a estender seus tentáculos pela administração federal. Figuras
fiéis a Lula, como Delúbio Soares, e a
Dirceu, como Silvio Pereira, funcionaram como peças da engrenagem de
contornos mafiosos escondida sob os
mantos do governo e do partido.
A camarilha é um fim para Dirceu,
mas um meio para Lula, que acalenta
o sonho de fundir a sua corrente política ao PSDB. Na conjuntura de crise
aberta pelo desvendamento da ação
da quadrilha, Lula tentou acelerar a
implosão do PT por meio da candidatura de Tarso Genro à presidência do
partido. Mas a "refundação", um nome pomposo para a operação de descarte da carcaça de Dirceu, despedaçou-se contra o rochedo do instinto de
sobrevivência do Campo Majoritário.
A candidatura de Ricardo Berzoini é o
fruto do acordo circunstancial costurado entre Lula e seu antigo operador.
A crise lança um jato de luz sobre a
trama política de fundo. A chapa oficial do Campo Majoritário, apoiada
por Lula e montada em torno de seu
ex-ministro, é a chapa de Dirceu. À
sombra do Planalto, os 820 mil filiados
ao PT são conclamados a elegê-lo como seu dirigente político, o que equivale a consagrar nas urnas internas a
camarilha e identificar o partido à delinqüência organizada.
Há dias, Marilena Chaui denunciou
o "ódio ao PT" que emerge na crise (e
que existe de fato), mas, significativamente, "esqueceu-se" de mencionar o
"ódio à camarilha" difundido nas bases sociais petistas. No domingo, os filiados do partido têm a oportunidade
histórica de fazer o que a filósofa não
faz: separar o PT da camarilha, recusando o voto à chapa de Dirceu e dos
usuários do "mensalão".
Demétrio Magnoli escreve às quintas-feiras
nesta coluna.
@ - magnoli@ajato.com.br
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