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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Serra no espelho
SÃO PAULO - Há poucos dias, durante sabatina no jornal "O Globo",
no Rio, José Serra caracterizou a
disputa presidencial como uma
"luta entre um mito e uma proposta". Segundo ele, o "modelo Lula se
esgotou", entre outras coisas porque seria uma mistura de "incompetência, desconhecimento da realidade e falta de propostas".
Há, de fato, várias incertezas no
horizonte político, sobre as quais os
adversários de Dilma especulam o
que lhes convém, quase sempre
exagerando no apito. Mas a fala de
Serra parece se dirigir antes ao espelho, aos tucanos e a seus aliados.
Incompetência, desconhecimento da realidade e falta de propostas... Qual, afinal, a plataforma da
oposição depois que Lula mostrou
que o buraco do país é mais embaixo? Serra disse ser, no último debate, o "candidato da democracia".
Também insiste que só ele tem a
chave do crescimento sustentável.
Mas não foi exatamente a combinação das duas coisas -democracia e prosperidade- que consolidou o mito Lula? Ou a inclusão em
escala inédita promovida pelo
atual governo não representa, antes de tudo, um avanço democrático? Democracia pressupõe, sim,
respeito às liberdades individuais,
mas também é, com o perdão da obviedade, criação e ampliação de direitos sociais (sobretudo neste país,
ainda terrivelmente desigual).
Ao mesmo tempo (é preciso às
vezes pensar coisas "ao mesmo
tempo"), o PT, ou a maior parte dele, se rendeu à pior herança da política brasileira com o ímpeto de um
emergente, convidando para o banquete fisiológico de sempre personagens novos, antes acostumados
a ver a festa pela janela. É óbvio que
nada, nem o "mito Lula", justifica
ou torna toleráveis os escândalos
em série deste governo.
Neste ambiente "dominado" pelo mito, que mistura avanço e retrocesso, a Serra acabou restando o
papel menor de vítima e porta-voz
de si mesmo, contra as taras do Estado petista. A direita precisa de um
ator mais convincente.
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