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Biodiesel derramado
Programa não atinge meta de produção, mas governo federal já estuda antecipar mistura de 5%, planejada para 2013
AS DIFICULDADES do programa de biodiesel do
governo federal ilustram a máxima segundo a qual o caminho para o inferno está pavimentado de boas intenções. Não há carência delas
no projeto, em especial quando o
presidente da República está por
perto, geralmente sobre um palanque. O que seus muitos discursos pintam como salvação
ecológica da lavoura familiar se
acha à beira do fracasso no chão
duro da realidade.
Em lugar de absorver a mamona e o dendê que o romantismo
presidencial sonha ver colhidos
no Nordeste e no Norte por agricultores pobres, as mais de 40
usinas de biodiesel autorizadas
usam como matéria-prima entre
80% e 90% de soja. Depois que os
preços da commodity subiram
nos mercados interno e externo,
o litro do óleo comestível de soja
foi a R$ 2 e bateu o R$ 1,80 obtido
pelo produtor de biodiesel.
Com isso, até o mês de agosto
haviam sido produzidos só 261
milhões de litros do biocombustível, menos de um terço do projetado para 2006/2007. Tal volume é insuficiente para cumprir o
objetivo de tornar obrigatória,
em 2008, a mistura de 2% de biodiesel a todo o óleo diesel comercializado. Para tanto, haveria que
garantir 800 milhões de litros
anuais, mas em 2007 a produção
não deve chegar a 400 milhões.
Capacidade instalada nas usinas não falta, pois elas estão aparelhadas para quase 2 bilhões de
litros. Falta é matéria-prima em
volume e preço compatíveis. A
mamona e o dendê de Lula não
respondem nem por 3% da produção (até sebo e algodão ganham das oleaginosas que o presidente já chamou de "pés de petróleo"). Com a estiagem dos últimos meses, a safra dos pequenos produtores deve ter quebra
de 20%, avalia o Ministério do
Desenvolvimento Agrário.
Com o fito de transformar o
biodiesel num programa de inclusão, o governo criou até um
"Selo Combustível Social" para
distinguir usinas que apóiem
agricultores familiares. De posse
da chancela, elas ganham acesso
aos leilões de compra do combustível, a financiamentos do
BNDES e a isenções fiscais.
Apesar das vantagens, insuficientes ao que parece para contrabalançar o custo transacional
de obter o selo, a participação da
agricultura familiar no biodiesel
ainda é minoritária: 24%, segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário, ou 36%, para o de
Minas e Energia. É óbvio que o
planejamento não funcionou.
Em vez de rever o plano, o governo federal dá sinais de que pode acelerá-lo. Não só seria mantida a meta de mistura a 2% em
2008, como também se cogita
antecipar a de 5%, antes fixada
para 2013. O raciocínio é que o
aumento da demanda por decreto elevaria os preços e, assim, a
remuneração dos produtores.
Calcula-se que isso acrescentaria dois centavos ao preço do diesel, que teriam de ser cobertos
pelo Estado ou pelo consumidor.
É o mesmo que pavimentar a estrada malprojetada do biodiesel
também com subsídios ou inflação, além de boas intenções.
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