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FERNANDO RODRIGUES
"Nós lamentamos"
NOVA YORK - O momento mais
simbólico e patético da atual crise
até agora foi a aparição pública ontem, logo cedo, do presidente dos
EUA, George W. Bush, e de seu secretário do Tesouro (ministro da
Fazenda), Henry Paulson.
Constrangidos, envergonhados e
em posição explícita de genuflexão
ideológica, os dois admitiram a necessidade de usar dinheiro público
para comprar ações de bancos privados. O governo norte-americano
torrará US$ 250 bilhões, só para começar, na compra de participação
acionária em grandes instituições
financeiras do país.
Mas as falas de Bush e Paulson foram além da capitulação. Ambos fizeram questão de reafirmar a crença no capitalismo. Por mais paradoxal que possa soar, essas declarações de fidelidade ao modelo liberal
têm grande relevância: impedem a
conclusão epidérmica, já presente
aqui e ali, sobre uma possível falência inexorável ou reforma completa
do sistema monetário e financeiro
internacional. Não há indicações de
uma coisa nem de outra num horizonte próximo.
Duas frases são úteis para guardar na parede da memória. Bush
afirmou não haver a "intenção de
tomar o lugar do livre mercado, mas
de preservar o livre mercado". Paulson veio depois, compungido e explícito sobre seus atos:
"Nós lamentamos por tomar essas medidas. As medidas de hoje
não são as que nós gostaríamos de
tomar, mas as medidas de hoje são
as que nós devemos adotar para
restaurar a confiança no nosso sistema financeiro".
Em resumo, os governos dão agora, mas cobrarão de volta mais tarde. Os banqueiros ficarão mais ricos? Possivelmente. Haverá regras
novas? Algumas, sempre preservando a liberdade para o sistema
bancário descobrir brechas e aumentar seus lucros. E daqui a alguns anos enfrentaremos todos outra crise parecida. Ou pior.
frodriguesbsb@uol.com.br
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