São Paulo, terça-feira, 15 de novembro de 2005

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COM OU SEM PALOCCI

Não é bom para o país conviver com um quadro de indefinição em torno do Ministério da Fazenda. E é isso o que vem ocorrendo nos últimos dias, desde que o ministro Antonio Palocci, em resposta às críticas endereçadas a ele por sua colega Dilma Rousseff, manifestou a possibilidade de se afastar do cargo. Obviamente que o "fogo amigo" proveniente da Casa Civil não é um fato isolado nem o principal motivo da hesitação de Palocci. Na realidade, o enfraquecimento do ministro inscreve-se no contexto da crise política e decorre de uma onda de denúncias acerca de sua gestão em Ribeirão Preto e de sua eventual participação nos desvios em que incorreu o PT.
Ninguém melhor do que Palocci para saber se há ou não novos fatos espinhosos a serem revelados à opinião pública, mas mesmo que nada de mais grave apareça, o que já se conhece é suficiente para justificar o aprofundamento das investigações e deixá-lo exposto a suspeitas. Com efeito, cada vez mais a figura do ministro da Fazenda vai migrando das páginas econômicas para o noticiário sobre o escândalo de corrupção.
Noticiou-se ontem que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende colocar um ponto final nessa situação, anunciando em discurso oficial seu irrestrito apoio a Palocci. Ao mesmo tempo, o governo estaria tentando reforçar a "blindagem" do ministro, costurando um acordo com partidos oposicionistas para mantê-lo afastado das CPIs.
É correta a intenção do presidente de dirimir incertezas, mas não há garantias de que para isso bastem um discurso e um conchavo com líderes da oposição. Em tese, denúncias podem continuar surgindo de ex-assessores e de investigações da imprensa, tornando cada vez mais difícil deixar o ministro à margem dos inquéritos. Além disso, não fica de pé a tentativa de erigir Palocci em esteio da economia brasileira, como se a sua ausência fosse varrer o país para um período de crises e turbulências.
É claro que, se o presidente Lula, na eventualidade de se ver forçado a uma troca, optar por uma reviravolta completa na condução da política econômica, as reações seriam amplamente desfavoráveis. Não parece, porém, que essa perspectiva esteja no horizonte. Quanto a uma correção de rumos, que aponte para uma gestão menos conformista da política monetária e mais eficaz do ponto de vista do crescimento, é algo que até mesmo economistas de várias linhas vêm pregando.
O ministro Palocci, sem nenhuma dúvida, tem apresentado méritos e virtudes no desempenho de suas funções. Acima de tudo, conseguiu conferir credibilidade à opção do governo de abandonar a pregação esquerdista de setores do PT e aderir a princípios básicos, como a responsabilidade fiscal, a estabilidade monetária e a previsibilidade na condução da política econômica.
O tipo de inflexão que esta Folha tem defendido na economia não se confunde, em nenhuma hipótese, com propostas irresponsáveis que contrariem tais princípios e representem risco de retrocesso. O próprio Palocci, desde que cercado de condições políticas, poderia, em tese, estar à frente de um processo de ajuste da política econômica -embora, na prática, o ministro venha se mostrando um entusiasta da lógica ultraliberal e financista que parece animar alguns de seus assessores.


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