São Paulo, terça-feira, 15 de novembro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

Gripe aviária: a resposta brasileira

SARAIVA FELIPE

O mundo assiste atualmente a uma epidemia de gripe em aves produzida por um subtipo de um vírus com alta capacidade de disseminação, o H5N1, cujo epicentro localiza-se na Ásia. Essa situação nos coloca um grave problema de saúde pública veterinária, responsável pela eliminação de 120 milhões de aves. Vivemos também uma possibilidade futura de uma nova epidemia global de gripe entre humanos, uma pandemia, para a qual temos que nos preparar a partir de hoje.
A preocupação com o futuro é a possibilidade de esse subtipo aprender a se transmitir entre seres humanos, situação impossível de prever se e quando ocorrerá. Desde 2003, cerca de 120 pessoas que tinham contato direto com a criação e abate de frangos se contaminaram, mas não há transmissão entre pessoas. Como o vírus da gripe pode apresentar mutações, na eventualidade de o H5N1 passar a ser transmitido entre pessoas, teríamos um subtipo com alta capacidade de dispersão.
Essa condição foi responsável pelas quatro pandemias de gripe registradas no século 20, algumas com altíssimo impacto, como a Gripe Espanhola, de 1918, e outras consideradas pandemias benignas, como a Gripe Russa, de 1977. Ressalte-se que o elevado número de mortes registradas na Gripe Espanhola foi provocado por complicações como bronquites e pneumonias. Graves à época, essas complicações podem ser tratadas eficazmente com os recursos hoje disponíveis.
Para responder a esse duplo cenário, do risco atual e do potencial risco futuro, o Brasil tem tomado iniciativas desde 2003, quando teve início o ciclo de epizootia (epidemia entre animais) de gripe aviária. Nossa condição de exportador, e não importador de aves, já atenua a possibilidade de introdução do vírus, que pode ocorrer, por exemplo, por aves selvagens migratórias.


Vivemos a possibilidade de nova epidemia global de gripe entre humanos, para a qual temos que nos preparar a partir de hoje

Assim, medidas imediatas têm sido adotadas para restringir ainda mais a entrada de produtos avícolas, a importação de aves exóticas, a intensificação de inquéritos sorológicos em aves migratórias e barreiras que impeçam o contato entre essas aves selvagens e os frangos de criação. Além disso, é imprescindível a notificação imediata pelos produtores de qualquer caso suspeito de gripe aviária.
O Brasil foi um dos primeiros países a se mobilizar. Em 2003, foi formado um Comitê Técnico para Elaboração do Plano de Preparação para uma Pandemia de Gripe, com especialistas de diversas áreas.
Várias medidas já foram implantadas, como, por exemplo, o fortalecimento da vigilância epidemiológica, que conta atualmente com 46 centros integrantes. Protocolos para treinamento de médicos e outros profissionais de saúde estão prontos, assim como previsão de leitos hospitalares e outras necessidades assistenciais. Encomendamos quantidade suficiente do antiviral e expressamos nosso interesse de avaliar, do ponto de vista técnico e financeiro, a viabilidade de transferência tecnológica para produção nacional.
Outra medida relevante é a instalação da planta para fabricação nacional da vacina contra gripe. Fruto de parceria com o governo de São Paulo e investimentos de mais de R$ 30 milhões, o Instituto Butantan está construindo uma fábrica moderna para a vacina utilizada nas campanhas anuais, dentro de acordo de transferência tecnológica com o laboratório Sanofi-Pasteur. A unidade estará pronta no final de 2006 e capacitada, se houver uma emergência, para a fabricação da vacina contra o vírus da pandemia já no início do ano.
O Brasil será um dos primeiros países em desenvolvimento a ter auto-suficiência na produção da vacina contra a gripe tanto para o uso nas campanhas como para uma eventual pandemia.
Apresentei nosso plano no mês passado, na Reunião Ministerial sobre Cooperação Global, em Ottawa, no Canadá, com a Organização Mundial da Saúde (OMS) e ministros da Saúde de 30 países com papel de lideranças regionais. Defendi a necessidade de atuação em rede dos países para fortalecer a vigilância em escala mundial e a facilitação do acesso às vacinas e aos medicamentos antivirais, particularmente para países mais pobres.
Estamos diante de um problema global que só será adequadamente enfrentado num ambiente de solidariedade e transparência, que garanta a mobilização de recursos técnicos e financeiros para uma ação rápida e oportuna.
De amanhã até 18 de novembro, reuniremos, no Rio de Janeiro, autoridades e especialistas do mundo inteiro para divulgar e discutir as medidas do Plano Nacional. É importante ressaltar que a população não está desprotegida. Nenhum país está livre do risco da gripe aviária ou até mesmo de uma pandemia. No entanto, o Brasil, atuando de maneira articulada com outros países e organismos internacionais, está atento para efetivamente reduzir os riscos de ocorrência de uma pandemia de gripe e de suas conseqüências.

Saraiva Felipe, 53, médico sanitarista, é o ministro da Saúde. É professor licenciado de medicina preventiva e social da Faculdade de Medicina da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), deputado federal licenciado (PMDB-MG) e ex-secretário de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde (1989-1990).

Texto Anterior: Frases

Próximo Texto: Ives Gandra da Silva Martins: Os bancos e o direito do consumidor

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.