São Paulo, segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

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TENDÊNCIAS/DEBATES

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Porque é melhor para a Câmara

CIRO NOGUEIRA


Se for presidente da Câmara dos Deputados, não irei indicar ninguém para nenhuma posição no governo federal

EXATAMENTE por ser mais transparente, o Legislativo é o Poder mais devassado, mais exposto e, portanto, mais sujeito a críticas. Só existe um modo de fortalecer a credibilidade de uma instituição como a Câmara dos Deputados: mudando na raiz a forma de seu funcionamento. Sou candidato a presidir a Casa porque creio que é preciso mudar a lógica que conduz o Poder Legislativo, começando pela eleição de seu presidente.
A Câmara está diante de dois caminhos nos próximos dois anos. De um lado, há uma lógica que procura submetê-la a uma equação externa que nada tem a ver com a instituição. Por essa lógica, a Câmara é rebaixada a mera peça do xadrez político, cuja utilidade única é servir como trunfo do PMDB para as eleições presidenciais de 2010. Ou para reforçar a capacidade do partido de expandir suas ambições na máquina federal. Essa lógica só não leva em conta os interesses da própria Câmara nem a necessidade de darmos pronta resposta ao país.
Faço parte de um grupo amplo de parlamentares que enxerga que a solução para a Câmara não pode vir de fora para dentro, mas de dentro para fora. Somente ela pode resolver seus problemas, restaurando o respeito que precisa merecer da sociedade. E isso se faz mudando a forma como é conduzida, já a partir da escolha de sua Mesa Diretora.
O Legislativo só irá recuperar seu espaço se for capaz de legislar, voltando a cumprir sua missão constitucional. Quando a Câmara é reduzida a moeda de troca de maquinações partidárias, significa apenas adiar o que precisa ser feito.
Minha candidatura só existe porque vocaliza um sentimento generalizado entre meus pares de que não podemos repetir um tratamento que já não deu certo. O deputado Michel Temer, que respeito, já teve a oportunidade de presidir a Câmara por quatro anos, mas isso significa que a Câmara passou a ser mais respeitada desde então? Com todo o respeito, não.
A pergunta que muitos me fazem é sempre a mesma: você insistiria mais um biênio num remédio que já usou por quatro anos e que não foi capaz de curar a doença? Ainda mais quando se sabe que essa doença só piorou?
E qual seria então essa doença que ataca o Poder Legislativo?
O foco da chaga está no fato de que a Câmara vem sendo usada como plataforma do poder partidário de algumas legendas. É como se o presidente da Casa se transformasse num superlíder e, a partir daí, passasse a usar o poder da instituição não a favor dela mesma, mas para reforçar a ocupação de seu partido no plano federal. Esse é o tumor que precisa ser extirpado.
Nesse roteiro, a cada eleição, primeiro levanta-se estrategicamente a cortina de fumaça contra o "baixo clero". Depois, galvaniza-se uma rejeição na sociedade contra esse fantasma -aí, elegem-se os mesmos, e tudo permanece igual. A questão fundamental não é o alto ou o baixo clero, mas o alto ou o baixo nível na política.
O presidente da Câmara deve respeitar uma escrupulosa neutralidade política. Fico imaginando se um novo presidente do Supremo Tribunal Federal, no primeiro despacho com o presidente da República, passasse metade do encontro falando sobre as questões constitucionais e a outra metade com uma lista de nomeações para o Executivo. Seria um escândalo.
Mas o mais assombroso é que isso vem acontecendo com a Câmara há muito tempo e simplesmente parece algo natural. Quando não pode ser.
Como presidente, não irei indicar ninguém para nenhuma posição no governo federal. Não é mais possível aceitar esse conflito de interesses. Até porque tal prática cria um foco de crise permanente, pondo interesses partidários ou pessoais acima do interesse maior da instituição. Isso desestabiliza artificialmente a relação entre os Poderes e apequena o Legislativo.
A Câmara tem que voltar a estar de pé, com independência. Precisamos voltar a legislar. Se a Câmara votar apenas o que está em seus escaninhos, já terá dado um grande passo.
Precisamos também terminar a Constituição, regulamentando artigos aprovados há duas décadas. Precisamos urgentemente acabar com o balcão das emendas parlamentares, por meio da adoção imediata do orçamento impositivo.
A Câmara precisa ser mais Câmara.
Ou então continuará a ver suas atribuições usurpadas pelos Poderes Executivo e Judiciário.
Faço parte de uma nova geração de homens públicos responsáveis e devotados que acreditam que é possível mudar essa situação, começando por seus fundamentos. É por isso que sou candidato a presidente da Câmara dos Deputados de meu país: porque é melhor para a Câmara.


CIRO NOGUEIRA LIMA FILHO, 40, advogado, é deputado federal pelo PP-PI.


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