São Paulo, sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

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TENDÊNCIAS/DEBATES

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A modernidade contra o crime

ROMEU TUMA


Doravante, nosso Judiciário poderá dispor legalmente de avançadas tecnologias em tempo real para agilizar as varas criminais

A SANÇÃO da lei que permite aos juízes interrogar réus presos e ouvir testemunhas por meio de videoconferência conferiu matiz de modernidade ao Estado brasileiro, enquanto coroava o esforço parlamentar desenvolvido por senadores e deputados nos últimos seis anos.
Em viagem à Bahia, o presidente Lula utilizou assinatura eletrônica para sancionar a lei que legitima tal procedimento judicial. Demonstrou assim, na prática, como a informática agiliza a gestão do Estado. Simultaneamente, sinalizou que o procedimento televisual deverá acelerar o ato de fazer justiça numa área do Direito há demasiado tempo transformada em pesadelo para a população.
A videoconferência representa o fim de uma clamorosa fonte de insegurança, isto é, o vaivém dos piores criminosos pelas vias públicas, sob escolta policial, para inquirição fora dos presídios onde deveriam permanecer recolhidos devido à própria periculosidade e à dos asseclas em liberdade.
Impedindo resgates quase sempre sangrentos e liberando de 700 a 800 policiais para o policiamento preventivo rotineiro, a lei nº 11.900 também traz, desde o dia 8 último, substancial economia aos cofres públicos, estimada em R$ 1,2 milhão na área federal e R$ 6,6 milhões em São Paulo, por ano.
O texto legal permite ouvir testemunhas pelo mesmo método. Em nada prejudicará o trabalho dos advogados. Instituiu o interrogatório televisivo como procedimento de caráter excepcional, dependente de fundamentada decisão do magistrado. A regra passou a ser a ida do juiz ao presídio para interrogar o réu ali recolhido, desde que lhe garantam a segurança, assim como a do promotor e dos auxiliares, além da presença do defensor e da publicidade do ato.
Para produzir a inovação de maneira harmônica com os preceitos da Constituição e do Código de Processo Penal, notadamente o direito à mais ampla defesa, diversos projetos tramitaram no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, a exemplo do primeiro, que apresentei há seis anos e recebeu o número 248/2002.
Em 3 de maio de 2003, senadores, deputados e membros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior de Justiça presenciaram no auditório do programa Interlegis do Senado, à época sob minha responsabilidade, a videoconferência pioneira em que a juíza Carmem Lúcia da Silva interrogou 11 integrantes do PCC recolhidos à penitenciária de Presidente Bernardes e outros três, presos no Centro de Detenção Provisória do Belém, em São Paulo. No Fórum Criminal da Barra Funda, estavam a magistrada e quatro testemunhas de acusação. A Prodesp e o Interlegis usaram a mais avançada tecnologia, a exemplo de links de alta velocidade, imagem em tempo real, telefone IP, impressoras e scanners para transmissão de documentos assinados.
Em dezembro de 2007, para contornar óbices de tramitação ao meu projeto de 2002, troquei-o por nova propositura. Todavia, o Senado achou melhor aprovar o substitutivo com que o senador Tasso Jereissati alterou projeto de lei anterior, entregue à Mesa pelo senador Aloizio Mercadante. O texto aprovado seguiu para a Câmara dos Deputados. Voltou ao Senado na forma de novo substitutivo, que me coube relatar. Rejeitei algumas modificações e preservei outras.
Creio que, ao final, a lei contemplou o almejado pelas duas Casas do Congresso Nacional. Também parece ter sido assim entendido pelo presidente da República, pois a sancionou com um único veto, referente ao prazo para devolução de cartas precatórias.
Espera-se que essa nova lei elimine os problemas criados pelos recursos que buscam anular processos criminais devido ao uso daquele meio de interrogatório.
Em 31 de outubro passado, o plenário do STF entendeu ser inconstitucional a lei paulista nº 11.819 de 2005, que autorizava a videoconferência neste Estado. Isso porque é de competência privativa da União legislar sobre direito processual penal. Foi um revés para a Justiça de São Paulo, que, entre 2005 e agosto de 2008, realizou 3.533 videoconferências, principalmente com réus da mais elevada periculosidade.
Doravante, o Poder Judiciário brasileiro poderá dispor legalmente de avançadas tecnologias em tempo real para agilizar suas varas criminais, economizar recursos públicos e favorecer a segurança da população.


ROMEU TUMA, 77, senador da República (PTB-SP) em segundo mandato, é corregedor do Senado Federal e delegado aposentado da Polícia de São Paulo. Foi diretor-geral da Polícia Federal (1985-92) e secretário da Receita Federal (1992).


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