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São Paulo, domingo, 16 de fevereiro de 2003

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TERROR, GUERRA, RECESSÃO

Havia muito tempo que não se via o ambiente internacional tão perturbado pela insegurança e pelo pessimismo. Confluem para o mesmo ponto e se reforçam mutuamente o medo do terrorismo, o medo da guerra e o medo da recessão. A sensação é a de que as principais decisões políticas do planeta são tomadas num labirinto de irracionalidade. Algumas das lideranças globais não apenas têm sido incapazes de romper esse círculo de escuridão. Têm contribuído decisivamente para manter as luzes apagadas.
A onda conservadora catapultada após os insanos atentados de 11 de setembro reúne elementos talvez nunca antes associados na política global e, em especial, na dos EUA. Os assessores mais radicais do presidente George W. Bush tornaram-se mais fortes no governo. Leis e decretos presidenciais que fustigaram os direitos civis -que teriam pouquíssimas chances de serem aprovados em tempos normais- foram à frente com mínima resistência.
Mas a escalada de ações contra o espírito, por assim dizer, generoso da tradição democrática ocidental não parou por aí. A proposta orçamentária que o governo Bush enviou há pouco para o Congresso tem sido considerada mais draconiana no corte de benefícios sociais e no favorecimento da parcela mais rica da população do que as "conquistas" do governo de Ronald Reagan (1981-1989) nessa área.
A mudança de foco na política, porém, não se resumiu aos Estados Unidos. Nos países desenvolvidos em geral, pioraram as condições de vida dos imigrantes e de seus descendentes. Foram açulados preconceitos antigos, como o de que os estrangeiros são os responsáveis pelo desemprego dos "nativos" ou o de que oneram os serviços de bem-estar social e prejudicam sua qualidade. A associação imediata entre terrorismo e imigração também foi reforçada. Filões maiores dos orçamentos públicos foram destinados a ações e aparelhos de segurança interna.
A prevalência das doutrinas e das práticas ultraliberais ao longo das décadas de 80 e 90 já havia enfraquecido em grande medida a idéia de que cabe à política -e, por consequência, ao Estado- promover o bem-estar dos cidadãos, através da proteção aos mais pobres e da busca do pleno emprego. O novo conservadorismo, no entanto, associou aquela mesma visão fundamentalista da liberdade dos mercados a um processo de hipertrofia das estruturas de segurança do Estado.
Uma ordem ao mesmo tempo policial e ultraliberal parece em franca gestação. A guerra, a total transferência da arbitragem entre riqueza e pobreza para o livre mercado e a desconfiança contra imigrantes de países pobres vão sendo tratadas, no mundo rico, como contrapartidas para a liberdade nacional.
Ficou relegada ao segundo plano a concepção da política como o exercício da generosidade e da racionalidade. Que os protestos de ontem em todo o mundo, contra a guerra e pela resolução pacífica dos conflitos, possam fazer eco na consciência dos principais governantes do planeta. A manutenção dos parâmetros ora vigentes na grande política global só aprofundará a insegurança.



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