São Paulo, sexta-feira, 16 de abril de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

Usucapião

BRASÍLIA - Em vez de aproveitar o esfriamento do caso Waldomiro para acertar o passo, o governo Lula continua tropeçando. Às vezes, inexplicavelmente e em pequenas coisas.
Afinal, que sentido há em dona Marisa Letícia instalar a estrela vermelha do PT nos jardins (tombados, frise-se) do Palácio da Alvorada e da Granja do Torto?
E qual o sentido de a segurança da Presidência dispensar o coro de 80 meninas da Febem que cantariam ontem para Lula em São Paulo?
A estrela consolida a sensação de que a turma está adorando o poder e se sente "em casa". Lula usa metáforas nas cerimônias oficiais como se estivesse na varanda com amigos; Marisa Letícia diz que vai doar ao Estado jóias recebidas como primeira-dama e, até agora, nada; Dirceu libera a chave da casa para o filho entrar e sair na hora em que bem entender; o PT mudou móveis, utensílios e velhos funcionários da administração por gente sua como se viesse para ficar para sempre. "Daqui não saio, daqui ninguém me tira."
Peraí. Símbolos do poder são permanentes, e governos são transitórios. Não há usucapião. O Alvorada não virou propriedade do PT porque o petista Lula está lá por quatro ou mesmo que sejam oito anos. É um símbolo da Presidência da República.
Quanto às meninas da Febem, é de chorar. Lula, o velho líder sindicalista, o torneiro mecânico, o retirante que hoje mora e despacha em palácios, confraterniza com banqueiros, empresários, governadores -a elite. E é impedido de receber um coral de menores em fase de reabilitação?
Se tudo estivesse maravilhoso na economia, nos empregos, nos salários, na política congressual e nas políticas sociais, essas coisas passariam batido, quase registros sobre "falta de experiência", "erros de assessoria". Do jeito que a coisa vai, só engrossam o caldo da desesperança. E desembocam na perda crescente de popularidade do presidente.
Alguém precisa dar ordem à casa. E não é metendo estrela vermelha no Palácio da Alvorada.


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