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JOSÉ SARNEY
Risco Brasil
As dores de cabeça do presidente
Lula não devem ser poucas. Ele
assumiu com uma metodologia nova,
invenção dos bancos internacionais
envolvidos no mercado financeiro,
com uma tal avaliação diária da vulnerabilidade dos países emergentes. No
nosso caso, apareceu um chamado
"Risco Brasil", que a cada dia baixa e
sobe, com motivações complexas que
ninguém sabe verdadeiramente como
se constroem.
A verdade mesmo é que o "Risco
Brasil" agora não está mais em Wall
Street, mas na Rocinha. O meu receio
é que se estabeleça nesses mercados
um risco mais claro e efetivo, como esse que tomou conta do Rio de Janeiro.
Os jornais já não recusam o tratamento de "guerra civil no Rio de Janeiro" e,
para desconforto nosso, aquela história que se dizia do ameaçador inferno
-que "ele é aqui"- pode dar numa
afirmação que o Iraque também é
aqui.
Para aumentar nossos temores ou
tremores, o MST anunciou e cumpriu
com bastante clareza que abril seria o
mês vermelho, sem que se soubesse
que este mês também seria, em matéria de violência, um setembro negro.
Às batalhas da Rocinha soma-se o que
acontece em Pernambuco, onde quatro grupos disputam qual o mais radical na invasão de fazendas com o objetivo de levar na marra a reforma agrária.
Na Bahia, alega-se que não se come
eucalipto e, assim, derrubam-se as árvores. Se aplicássemos a mesma tese à
Amazônia, não se come jatobá, angico, maçaranduba, pequi e todo verde
que ali se mescla com as águas, naquele mundão de beleza que mais parece
o primeiro dia da criação.
Se um investidor, ou mesmo um
brasileiro comum, somar todas essas
coisas e desejar fazer o seu cálculo do
"Risco Brasil", o riscômetro vai levar
o mercúrio às alturas.
Na política as coisas também não estão tão calmas. As reivindicações de
salário estão em gestação ou em trabalho de parto. As medidas provisórias -e nunca deixo de advertir que
elas são um obstáculo ao aprofundamento de nossa democracia- obstruem as pautas do Senado e da Câmara, e o trabalho legislativo fica a reboque delas.
Evidentemente este ano é um ano de
eleições, e tudo isso deve estar no contexto desse 2004 atípico, a começar
por ser bissexto. Não esperemos que
nos próximos meses a temperatura
possa baixar ou que as paixões se arrefeçam no embate das urnas.
Mas o mundo é assim mesmo e, de
tanto vivermos crises, já estamos
meio anestesiados com elas. Quem viveu muitas delas e assistiu a esse vai-e-vem da espécie humana foi um não-humano, o cágado Trinity, que era
mascote da marinha inglesa, tomou
parte em batalhas, viajou mares tenebrosos e morreu, agora, com 160 anos.
Coisa que não desejamos a ninguém.
Só jaboti agüenta.
Outros que também não estranham
essas coisas são os gatos, pois agora
descobriram que eles convivem com
os homens, domesticados, há 9.500
anos. Assim, se o cão é o maior amigo
do homem, é o gato que há mais tempo o suporta.
Crise, também, está existindo no
Maranhão. Os urubus do aeroporto
de Teresina, que estavam ameaçando
os aviões, foram capturados e mandados para o sertão maranhense, de onde não podem voltar. E, assim, reclamações muitas chegam contra os urubus que estão chegando do Piauí.
Com todas essas coisas, não é de admirar que o "Risco Brasil" preocupe
os investidores e que a guerra da Rocinha nos congele os ossos.
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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