São Paulo, sexta-feira, 16 de abril de 2010

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FERNANDO DE BARROS E SILVA

Brasília, 50

SÃO PAULO - Brasília faz 50 anos na próxima quarta-feira, dia 21. Por pouco os festejos não apanham o governador cassado do Distrito Federal na cadeia. Não há dúvida de que a obra de Oscar Niemeyer é mais importante que a arte de José Roberto Arruda. Mas a coincidência triste entre a data e o momento histórico dá o que pensar.
Quem iria imaginar que a capital futurista, a cidade-símbolo do ideário nacional-desenvolvimentista, completaria meio século às voltas com um enredo digno de Sucupira? Brasília, na origem, representou a promessa de progresso com integração social, a síntese material de uma civilização brasileira possível.
Essa comunhão nacional fantasiosa há muito virou pó. E a cidade que nasceu no meio do nada, artificialmente moderna, se converteu em palco de um pastelão dos herdeiros de Odorico Paraguaçu.
A roubança desenfreada e o colapso político-administrativo no DF tornaram mais visíveis, por paradoxal que pareça, a importância muito acanhada da capital do país. Assistimos, afinal de contas, a um típico escândalo de província.
Brasília, provinciana? Sim. Não uma mistura de Miami com Copacabana, como na canção de Gordurinha celebrizada por Gilberto Gil, mas, talvez, de Miami com Goiânia no seu espírito profundo. A nacionalidade cosmopolita que o Plano Piloto pretendia acolher foi devorada pela cidade da vida real, atropelada por um Brasil ao mesmo tempo pré e pós-moderno, que se vingou do delírio modernista de Niemeyer.
Essa sabotagem -urbana, social, histórica- está escancarada na tragédia das cidades-satélite, mas também na especulação imobiliária que inundou a capital de construções monstruosas. Joaquim Roriz de um lado, Paulo Octávio do outro. A era Collor reuniu numa só figura o que a cidade tem de pré e pós-moderno.
Resta, sob o céu infinito do planalto, o tesouro arquitetônico da humanidade, o museu precoce do que não fomos, o testemunho artístico de uma frustração histórica.


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