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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Brasília, 50
SÃO PAULO - Brasília faz 50 anos
na próxima quarta-feira, dia 21. Por
pouco os festejos não apanham o
governador cassado do Distrito Federal na cadeia. Não há dúvida de
que a obra de Oscar Niemeyer é
mais importante que a arte de José
Roberto Arruda. Mas a coincidência triste entre a data e o momento
histórico dá o que pensar.
Quem iria imaginar que a capital
futurista, a cidade-símbolo do ideário nacional-desenvolvimentista,
completaria meio século às voltas
com um enredo digno de Sucupira?
Brasília, na origem, representou a
promessa de progresso com integração social, a síntese material de
uma civilização brasileira possível.
Essa comunhão nacional fantasiosa há muito virou pó. E a cidade
que nasceu no meio do nada, artificialmente moderna, se converteu
em palco de um pastelão dos herdeiros de Odorico Paraguaçu.
A roubança desenfreada e o colapso político-administrativo no
DF tornaram mais visíveis, por paradoxal que pareça, a importância
muito acanhada da capital do país.
Assistimos, afinal de contas, a um
típico escândalo de província.
Brasília, provinciana? Sim. Não
uma mistura de Miami com Copacabana, como na canção de Gordurinha celebrizada por Gilberto Gil,
mas, talvez, de Miami com Goiânia
no seu espírito profundo. A nacionalidade cosmopolita que o Plano
Piloto pretendia acolher foi devorada pela cidade da vida real, atropelada por um Brasil ao mesmo tempo
pré e pós-moderno, que se vingou
do delírio modernista de Niemeyer.
Essa sabotagem -urbana, social,
histórica- está escancarada na tragédia das cidades-satélite, mas também na especulação imobiliária que
inundou a capital de construções
monstruosas. Joaquim Roriz de um
lado, Paulo Octávio do outro. A era
Collor reuniu numa só figura o que
a cidade tem de pré e pós-moderno.
Resta, sob o céu infinito do planalto, o tesouro arquitetônico da
humanidade, o museu precoce do
que não fomos, o testemunho artístico de uma frustração histórica.
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