São Paulo, sexta-feira, 16 de agosto de 2002

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JOSÉ SARNEY

Alan e Armínio

Nunca na história americana um presidente do Federal Reserve, o banco central de lá, teve tantos e extraordinários poderes quanto o Alan Greenspan, homem capaz de, numa simples declaração, derrubar e levantar mercados -além dos dotes mágicos de abortar o futuro.
O nosso Armínio Fraga, num espaço menor, não é tão diferente. Também aqui o BC nunca teve tanta visibilidade e prestígio. Quando chegou dos EUA, eu tive logo uma simpatia por ele, e esta veio do carinho com que desembarcou fazendo carícias no seu cachorro. Tornou-se ele voz conclusiva e opinião final sobre a política monetária. Para isso, tem talento, qualidades e força. Até na sucessão presidencial transformou-se em tema de debate: "Armínio fica ou sai?". Serra respondeu: "Fica". Lula: "Sai". Garotinho: "Não tô nem aí". Ciro: "Talvez". Armínio foi quem primeiro viu a necessidade de envolver a oposição na crise cambial. Chamou Mercadante para falar. Deu ciúmes e então foi o José Aníbal e o Ciro. Agora é a hora e a vez do presidente Fernando Henrique. Vai pedir divisão de responsabilidade sobre o acordo do FMI e vai receber todos com direito a foto e a flauta de serpente. Na realidade, o FMI não foi correto. Espalhou que o acordo era de US$ 30 bilhões e de módicas prestações. A primeira, de US$ 3 bilhões, antes das eleições. Outros US$ 3 bilhões para depois da eleição, a fim de conjurar o pânico de fim de mandato. E ainda o FMI fez uma coisa que não se faz. Pediu que o Brasil utilize suas reservas para segurar o dólar, o que aumenta a nossa vulnerabilidade. O resto, US$ 24 bilhões, só em 2003. Abacaxi a ser colocado como faca no pescoço do presidente eleito.
Para resolver essa intrincada equação, só há um homem: Armínio Fraga. Ninguém mais capacitado do que ele. De saída, tem o que ninguém tem. É brasileiro e americano. Tem dupla nacionalidade, o que lhe assegura ver as coisas com abrangente sentimento de isenção, porque raciocina pelos dois lados. Depois, ninguém mais do que ele conhece essas sutilezas do mercado, com experiência adquirida nos longos anos da casa de investimentos Soros. Sabe como podemos nos desviar das cascas de banana desse mundo de sobe-e-baixa. É unanimidade nacional e não há nenhuma suspeita sobre o seu comportamento, sangue de uma das melhores famílias brasileiras, da inteligência dos Fragas, que nos deram grandes cientistas e luminares da medicina.
Não percamos tempo. Todo poder a Armínio Fraga, como diria o nosso sempre lembrado Otto Lara Resende.
Ao contrário do que ocorre em outros países sul-americanos, cujo exemplo maior é a Argentina, os políticos brasileiros, em momentos graves, sempre se unem no terreno comum do interesse nacional e jamais colaboram com a política de terra arrasada, a mais arrasada das políticas.
Se fizermos assim, tenho absoluta certeza de que nossas interrogativas sobre o futuro serão desfeitas e teremos um fim de governo sem explosão, que virá em janeiro, por culpa não do Armínio, mas do povo brasileiro, que terá escolhido um novo presidente sem consultar o mercado!
Em janeiro de 95, o México explodiu. Salinas deixara o governo em novembro. Já, na Irlanda, o ex-presidente, de longe, apontou a causa: "Fueron los errores de diciembre...".
Deus queira que conosco não seja assim.


José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.



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