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TENDÊNCIAS/DEBATES
A proposta de reforma da Previdência merece apoio dos deputados do PT?
SIM
O que não fazer?
LINDBERG FARIAS
A votação da reforma da Previdência esquentou o debate sobre
o governo Lula entre velhos militantes
da esquerda. Alguns, em especial sindicalistas do funcionalismo público, já falam em sair do PT, acompanhando os
parlamentares que votaram contra o
governo e que provavelmente serão expulsos do partido. Esse, a meu ver, é um
grave erro político. A saída do partido
dos que têm posição mais à esquerda favorece a consolidação das forças mais
conservadoras no governo e fora dele.
Quero alertar aos mais desavisados
que a opção que alguns fizeram pelo
tensionamento às últimas consequências faz parte de uma estratégia política.
Querem ser expulsos do PT. Crêem que
chegou a hora da construção de um novo partido, este verdadeiramente revolucionário. No fundo, estão presos a um
velho esquema: o da Revolução Russa,
de 1917. Ou melhor, a uma leitura equivocada e esquemática de seus feitos. Lula seria uma espécie de Kerensky, e sua
chegada ao governo a senha para, como
os bolcheviques, denunciar o governo e
preparar o caminho para um levante insurrecional das massas ou a consolidação de nova direção revolucionária.
Esquecem das lições do próprio Lênin: "A essência da tática é a correlação
de forças". É de uma cegueira política
atroz não enxergar que momento histórico vive o mundo. Ignoram o fato de
enfrentarmos um período dominado
pela máquina agressora do império
norte-americano e de profunda defensiva das forças de esquerda. No Brasil, a
situação não é diferente. Ou alguém
acha que a real disputa do governo é
com a incipiente oposição de esquerda?
Não, a disputa é com a direita, que já
começou a colocar suas garras de fora
com o discurso de criminalização dos
movimentos sociais e a criação de um
clima artificial de descontrole e falta de
autoridade do governo. É a repetição do
velho e carcomido discurso da ordem.
Não creio na possibilidade de uma ultrapassagem pela esquerda a Lula e ao
PT. Se o governo for derrotado, não
vem o PSTU; voltam os tucanos e o PFL.
Não é hora, portanto, de criar um movimento de oposição pela esquerda, mas
de fortalecer uma ala à esquerda no governo e no PT que pressione e exija mudanças de rumos. A falta de uma avaliação equilibrada dessa correlação de forças pode levar uns a pensarem que
agem como os portadores da coerência,
quando na verdade estão sendo usados
como inocentes nas mãos da direita.
E, já que falamos da Revolução Russa,
não custa lembrar que, antes de outubro, houve as Jornadas de Julho, manifestações precipitadas e esquerdistas
condenadas por Lênin e Trótski, que
abriram caminho para a ascensão do
general Kornilov e a prisão das principais lideranças do povo. Ao meu ver,
ações como a tentativa de invadir o
Congresso e o próprio discurso de oposição de esquerda a Lula estão mais próximas dos equívocos das jornadas do
que dos acertos de outubro.
Mas a minha preocupação não é com
esses pequenos grupos e sim com inúmeros militantes e simpatizantes que,
tomados pela decepção com os primeiros meses do governo, ameaçam acompanhá-los e deixar o PT. Entendo a frustração. A agenda das reformas e a política econômica mostram que até agora
não houve um rompimento com as políticas neoliberais. Até entre os que concordam com a lógica inicial de busca de
uma relação de confiança com o mercado, há os que vêem erro na dosagem. O
aumento das metas de superávit primário para 4,25% do PIB e as taxas de juros
exageradas paralisaram a economia.
No entanto, creio que o jogo ainda
não acabou. Não está descartada a possibilidade de correção de rumos. São cada vez mais visíveis as contradições
dentro do governo. Se, por um lado,
predomina uma visão excessivamente
fiscalista e monetarista, cresce o coro
daqueles que avaliam que "o tempo encurtou" e defendem uma revisão de critérios no acordo com o FMI -há até
quem defenda que não devemos assinar
um novo acordo- para garantir uma
folga orçamentária para gastos sociais e
investimentos, indispensáveis para a retomada do crescimento. Não há como
crescer sem investimentos públicos.
O fato é que o jogo não acabou. Ao
contrário, está esquentando. Temos de
apostar em uma aliança ampla de forças
que juntem do mesmo lado os trabalhadores e os setores produtivos do empresariado contra essa hegemonia asfixiante do sistema financeiro; os setores da
esquerda do PT e dos movimentos sociais com a parte do governo que começa a entender que essa é a hora de iniciar
o descarte desse entulho monetarista. É
nessa batalha que o futuro do governo
Lula será decidido. Se persistir a política
atual, perde o Lula e toda a esquerda.
Volta a direita. Se, por outro lado, o governo entrar em uma outra fase que privilegie o crescimento econômico e a geração de empregos, teremos uma vitória, que, apesar de parcial, será importantíssima. Ela nos dará um tempo
maior na espera de uma alteração na
correlação de forças em nível internacional que poderá abrir possibilidades
para saltos maiores.
Lindberg Farias, 33, estudante de direito, é deputado federal pelo PT-RJ
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