São Paulo, sábado, 16 de agosto de 2008

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Editoriais

Orçamento ilimitado


Benefícios em cascata para juízes federais evidenciam dificuldades para controlar o gasto público nos Três Poderes

O CONTRIBUINTE deveria prevenir-se contra certos jargões correntes no funcionalismo. Quando uma categoria de servidores, por exemplo, pleiteia "equiparação salarial", a vítima potencial é o bolso de quem paga impostos. Isso porque a equiparação visada é sempre para cima.
O Supremo Tribunal Federal equiparou, em 1992, os vencimentos de seus 11 integrantes aos dos congressistas. O direito a auxílio-moradia de deputados federais e senadores também foi "equiparado" pelos membros da corte. Como até os parlamentares eleitos pelo Distrito Federal recebem a ajuda de custo -criada para beneficiar pessoas que vão trabalhar longe de casa-, a generosidade foi acrescentada ao salário dos ministros do STF.
O mais recente lance nessa cadeia de equiparações foi uma decisão do Conselho da Justiça Federal, revelada ontem por esta Folha. O órgão administrativo do Judiciário reconheceu que a mesma regra vale para todos os magistrados federais e mandou pagar auxílio-moradia, retroativo ao período entre setembro de 1994 e dezembro de 1997, a cerca de 4.500 juízes e desembargadores sob sua alçada.
O custo da equiparação em cascata, apenas no caso dos 3.000 magistrados trabalhistas contemplados, ultrapassará R$ 1 bilhão. A conta ficará mais alta para quitar os débitos com o restante dos juízes federais -e é provável que esse maná financiado pelos impostos recaia, mais à frente, sobre os magistrados estaduais, multiplicando o número de beneficiados e o ônus financeiro para a sociedade.
A reverberação de generosidades salariais, concedidas a qualquer título, pela folha de pagamentos do setor público é um dos fatores que dificultam o controle dos gastos com a máquina estatal. Se o Executivo -pela sua escala de servidores e por ser foco natural de escrutínio- tem sido o alvo mais constante das críticas a esse respeito, nos outros Poderes essa categoria de despesas disparam como se não houvesse limite orçamentário.
No Judiciário Federal, os gastos com pessoal, incluindo aposentados e pensionistas, consumiram 0,37% do PIB em 1995.
Onze anos depois, a respectiva folha de pagamentos já exigia da sociedade 0,71% de toda a renda produzida no país. Infelizmente, a autonomia constitucional do Legislativo, do Judiciário e do Ministério Público, por conta de uma interpretação equivocada, tem funcionado como salvo-conduto para criar despesas.
Autonomia institucional, no entanto, não deveria estar dissociada de responsabilidade fiscal. Se um ente do Estado dispõe de ampla liberdade para definir a sua própria receita, outros setores do serviço público, e a sociedade como um todo, arcarão com maior restrição orçamentária.
A solução para esse desequilíbrio é estabelecer regras, válidas para todos os Poderes, voltadas a disciplinar a evolução das despesas com pessoal -bem como a dos outros itens do chamado gasto público corrente.


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