São Paulo, terça-feira, 16 de setembro de 2008

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CLÓVIS ROSSI

Da oração à reunião

SANTIAGO - O embaixador Rubens Ricupero relatou no domingo, nesta Folha, os apelos desesperados de um diplomata norte-americano para que o Brasil e os países da América do Sul fizessem alguma coisa para resolver a crise boliviana do início dos anos 80, representada por uma narcoditadura chefiada pelo general Garcia Mesa.
O chanceler brasileiro da época, Saraiva Guerreiro, limitou-se a sugerir orações pela Bolívia. Menos de 30 anos depois (o que, em termos históricos, é bem pouco), o Brasil e seus pares da região já não rezam pela Bolívia. Ao contrário, reúnem-se em bloco para tentar ajudar. E -detalhe fundamental- não precisaram de apelos dos Estados Unidos. A iniciativa da cúpula da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) é "coisa nossa".
Não sei, ninguém sabe, se reunir-se resolverá mais do que rezar (por motivos técnicos, escrevo antes do término da cúpula). Mas que "as nossas coisas" melhoraram um bocado é inegável.
Primeira e essencial melhoria: como é que os países sul-americanos poderiam reagir a uma ditadura, ainda que narcoditadura, na Bolívia se quase todos também eram ditaduras? Hoje, todos são democracias.
Tudo bem que os regimes democráticos não resolveram os seculares problemas da sub-região. Mas a ausência da democracia só criou um novo e enorme problema: a ilegitimidade de origem dos governos autoritários e a violência institucional que todos praticaram.
A reunião da Unasul, mesmo que não tenha sido chamada com essa finalidade, é uma primeira aproximação ao passo seguinte necessário: como democracias podem ajudar-se umas às outras concretamente sem violar princípios como o da soberania e o da não-ingerência? Aliás, ainda são princípios sagrados em tempos de globalização e da decorrente cessão de soberania para blocos de países?

crossi@uol.com.br


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