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TENDÊNCIAS/DEBATES
Um alerta para as PPPs
JOÃO FRANCISCO MOREIRA VIEGAS
Crê o poder público que a gestão do projeto da linha 4 do metrô não está mais sob sua responsabilidade. Mas não é bem assim
AINDA NÃO estão claras as causas objetivas do desabamento
na linha amarela do metrô
paulistano. O número de vítimas também não está determinado. No entanto, há vários pontos obscuros no consórcio formado para viabilizar a obra.
O lamentável episódio, decorrente
do desabamento de um dos túneis de
acesso à nova linha do m na última
sexta, traz um pouco de luz às chamadas parcerias público-privadas.
Crê o poder público que a gestão do
projeto dessa linha do metrô não está
mais sob a sua responsabilidade. Isso
porque já houve licitação para outorga de concessão administrativa da
obra, saindo vitorioso o consórcio liderado pela CCR Concessões Rodoviárias, uma sociedade anônima de
cujo controle participam, entre outros, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e Serveng-Civilsan.
A lei nº 11.079/04, que autorizou
essa modalidade de concessão, é muito clara e determina, no art. 9º, que,
antes da celebração do contrato, deverá ser constituída sociedade de propósito específico, incumbida de implantar e gerir o objeto da parceria. O
projeto executivo da obra também é
de responsabilidade do contratado
(art.11), o que deve ter ficado claro no
edital de licitação e no contrato assinado entre os parceiros, para a implantação da nova linha.
Cumpre, porém, lembrar que, nessa modalidade de gestão, a administração pública não transfere a titularidade do serviço, mantendo, por conseqüência, o poder de direção e controle sobre sua execução.
Continua o poder público responsável pelo serviço, que é de sua titularidade, pois lhe foi atribuído por força
de lei. O concessionário gere a prestação do serviço, e a administração o
controla, configurando-se numa verdadeira polícia do serviço, que implica um contínuo e ininterrupto controle de inspeção e intervenção que se
manifesta de diferentes maneiras: ordens, atos de disposição, organização,
direção e planejamento do serviço.
Segundo Hector Escola, referidos
poderes de direção e controle podem
abranger quatro aspectos: o material,
relativo à execução da atividade objeto do contrato; o técnico, referente à
observância dos requisitos estabelecidos nos planos, especificações, regulamentos, cláusulas contratuais; o
financeiro, indispensável para a fixação das tarifas e verificação do equilíbrio econômico-financeiro; o legal,
que diz respeito à observância das
normas legais e regulamentares. A lei
nº 8.987, ainda que de forma esparsa,
previu essas formas de controle.
O exercício desse poder constitui-se num verdadeiro dever da administração, ao qual ela não pode furtar-se,
sob pena de responsabilidade por
omissão. Mas deve ser exercido dentro de limites razoáveis, não podendo
a fiscalização fazer-se de tal modo que
substitua a gestão da empresa.
Desde agosto do ano passado, pelo
menos, o consórcio responsável pela
construção da linha tinha conhecimento de problemas nas obras.
Relatório apresentado pelo Metrô
ao Ministério Público aponta que as
obras do trecho 12 "necessitarão de
atenção especial". O documento lista
as ruas Capri, Padre Carvalho, Campo
Alegre, Martim Carrasco e Cardeal
Arcoverde como as que deverão ter
maior atenção das construtoras. Nessas ruas, vários imóveis apresentavam rachaduras e outros danos.
O relatório reconhece que ocorreram deslocamentos de superfície e
recalques "induzidos pelo processo
de escavação". Estimava que 135 das
construções do local poderiam sofrer
recalques de cerca de 15 milímetros e
que outras 16 poderiam ter deslocamentos superiores a 25 milímetros.
Recomendou que, nas áreas mais
próximas ao eixo do túnel, além de
maior atenção, no caso de escavações
a fogo, que essa atenção em superfície
fosse estendida a pelo menos 20 metros de ambos os lados do eixo de escavação, ou seja, extensão equivalente a dois diâmetros do túnel. O Metrô
tomou conhecimento dos problemas
com a escavação do túnel a partir do
início de agosto do ano passado.
É necessário que os responsáveis
privados pela concessão e pela implantação do projeto venham a público para esclarecer as causas do desabamento e para anunciar as providências tomadas relativamente a possíveis vítimas e aos danos produzidos.
O que vimos nos últimos dias reforça as convicções dos que receiam que
possam as PPPs ser um grande negócio para os sócios privados e uma fonte de prejuízos inesgotáveis para governos e comunidades de contribuintes que pagam impostos.
O Ministério Público de São Paulo,
tenham todos a certeza, tomará as
medidas que se fizerem necessárias
para a correta apuração dos fatos e fixação das responsabilidades.
JOÃO FRANCISCO MOREIRA VIEGAS, 48, é procurador
de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional
das Promotorias de Justiça do Estado de São Paulo.
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