São Paulo, terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

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CLÓVIS ROSSI

O messias do Caribe

SÃO PAULO - O que me incomoda em Hugo Chávez não é o seu "socialismo do século 21" nem o seu histrionismo. Incomoda o autoritarismo, sim, as manobras para fazer-se votar, o incontrolável apetite pelo poder.
Mas o maior problema nem é esse. É o messianismo, essa ideia, que impregnou toda a campanha para o referendo de domingo, de "depois de mim, o dilúvio", típica do absolutismo monárquico. Homens (ou mulheres) do destino não existem, pelo menos não na minha concepção de mundo.
O messianismo na política termina sempre em tragédia -ou numa prolongada ditadura do "messias" ou na sua queda, em geral cruenta, seguida de um período, mais ou menos longo, de anarquia. Feita essa ressalva fundamental, é importante entender que Chávez, como todos os caudilhos populistas latino-americanos que o antecederam, não nasce de combustão instantânea. Nasce de necessidades e/ou percepções das camadas desfavorecidas da população, que buscam e buscam e buscam quem as ice da destituição.
Quando encontram alguém que o faça -ou parece fazê-lo-, agarram-se a ele de uma forma que acaba alimentando o messianismo. O peronismo na Argentina, talvez o mais acabado exemplo de populismo, foi muito isso -e permaneceu, ao menos como estado de espírito, mesmo depois de morto Perón. No caso de Chávez, suspeito que sua vitória se tenha devido menos à notória manipulação do eleitorado e mais ao fato de que hoje há postos médicos nos morros de Caracas, precários que sejam, mas melhores que o nada de antes.
Se quiser derrotar Chávez em 2012 (o que se aprovou foi apenas a possibilidade de reeleição, não a sua obrigatoriedade), a oposição terá que demonstrar aos destituídos que, acima de "messias", o sistema velará por eles. Como no Brasil, aliás.

crossi@uol.com.br


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