São Paulo, quarta-feira, 17 de março de 2010

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Pressão americana

Cresce insatisfação dos EUA com regras cambiais da China, que perturba o equilíbrio global com seus elevados superavits

A RÁPIDA emergência da China como potência de primeira grandeza implica mudanças na estrutura de poder global. Algumas projeções indicam que o PIB chinês será maior que o dos EUA antes de 2030. Em que pesem interesses comuns, há vários contenciosos entre os dois países -e outros por certo surgirão.
No campo econômico, o principal deles, no momento, diz respeito à política cambial da nação asiática, avaliada pelos EUA e por outros governos como "mercantilista" e nociva ao funcionamento da economia mundial.
A China adota um padrão de câmbio que oscila do fixo ao administrado. De 2006 a meados de 2008 foi permitida uma lenta valorização de sua moeda, o yuan, da ordem de 20% -estancada com o agravamento da crise internacional. Desde então a taxa mantém-se estável em relação ao dólar.
Neste período, a China acumulou saldos externos crescentes. Passou de um quase equilíbrio, em 2000, para superavits de US$ 430 bilhões, em 2008, e US$ 285 bilhões, em 2009 -ano de crise.
Para os americanos o yuan estaria subvalorizado em algo entre 20% e 40%. A prova seriam os volumosos superavits e o aumento das reservas chinesas no ritmo de US$ 30 bilhões por mês. A consequência da compra de dólares pela China é o aumento de sua posição credora, tema que passa a ser ainda mais sensível nos EUA em razão do alto desemprego e das eleições legislativas do final do ano.
Já o lado chinês considera que o câmbio não é responsável pelos superavits e que cabe aos EUA controlar sua tendência ao consumismo e aos deficits fiscais. A melhor contribuição que a China poderia dar à reordenação da economia mundial estaria em suas políticas de estímulo ao consumo interno.
A resistência chinesa é previsível. Um país superavitário sempre se oporá a valorizar sua moeda, dificultando o ajuste dos outros. Vem daí a assimetria recessiva do sistema monetário internacional -há muito identificada.
No embate, as duas partes vêm elevando o tom. Na sexta-feira passada, o premiê chinês afirmou que não considera a moeda de seu país valorizada e acusou os EUA de politizarem o tema. Além disso, reafirmou seu desconforto quanto à segurança dos títulos públicos americanos.
A resposta foi rápida: mais de uma centena de congressistas assinaram carta pedindo que o governo Obama declare a China um país "manipulador" do câmbio. Tal procedimento abriria caminho para uma queixa na Organização Mundial do Comércio -que dificilmente, no entanto, teria condições políticas de arbitrar uma disputa desse porte entre as duas grandes potências.
Não deixa de despertar preocupações a escalada deste conflito. Mas o fato é que seria desejável mais flexibilidade por parte do governo chinês. O país já perdeu há anos o "privilégio da irrelevância". Suas decisões ganharam peso sistêmico e seu superavit tornou-se um elemento de perturbação do equilíbrio global.


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