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RICARDO BONALUME NETO
Heróis de verdade
Apagão , painel do Senado, ranário milionário. As páginas de política viraram caso de polícia, as de
economia só trazem más notícias. É o
que basta para o brasileiro ter a recaída de praxe e voltar a achar que vive
no pior dos mundos.
Quem está desanimado e quer voltar
a ter um pouco de esperança no Brasil
e nos brasileiros deve assistir ao documentário feito pelo diretor Erik de
Castro: "Senta a Pua!".
Trata-se de um excelente antídoto
para aquela sensação de que este país
não tem como dar certo.
O documentário trata da história do
1º Grupo de Caça da Força Aérea Brasileira, uma das duas unidades de
aviação enviadas para combater na
Itália, na Segunda Guerra Mundial,
em 1944-1945.
"Senta a Pua!" era o gauchesco grito
de guerra da unidade; quer dizer algo
como se arrojar contra o inimigo, golpeá-lo duramente.
A história dos brasileiros na guerra é
exemplar pelo que ensina sobre governo e sociedade. O grupo de caça era
uma unidade de elite, composta pela
nata dos pilotos da FAB. Isso ajuda a
explicar seu excelente desempenho
em combate, até melhor que o de muitas unidades americanas do mesmo
tamanho. O pessoal de terra também
cumpriu suas funções de modo incrivelmente eficaz -eram os mecânicos,
armeiros etc., sem os quais os aviões
nem sairiam do chão.
O 1º Grupo de Caça mostrou que o
brasileiro, devidamente incentivado e
motivado, não deve nada a ninguém.
O governo da época, porém, não esteve à altura dos seus cidadãos. Não
houve um apoio dedicado aos combatentes. Os pilotos morriam em ação e
não havia o recompletamento da unidade. Mas os sobreviventes continuaram em frente e escreveram uma bela
página de heroísmo.
O Brasil também mandou para a
guerra na Itália uma força de infantaria, a FEB (Força Expedicionária Brasileira), volta e meia espezinhada pelos ignorantes ou pelos politicamente
mal-intencionados.
A FEB, ao contrário dos pilotos de
caça, não era uma tropa de elite. Mas
era um retrato fiel da sociedade brasileira e representou dignamente o Brasil na luta mais importante do século
passado para acabar com o nazi-fascismo.
"A FEB era um bom resumo do povo do Brasil, não só porque tinha soldados de todos os seus Estados e de todas as classes sociais e níveis de cultura, como porque levava todos os seus
defeitos e improvisações, todas as suas
incoerências e mitos, todas as falhas e
virtudes desse povo", escreveu em
1969 o escritor Rubem Braga, que
acompanhou a FEB como correspondente de guerra.
Hoje os veteranos do Grupo de Caça
e da FEB são senhores idosos, que
guardam preciosas memórias. Alguns, aqui em São Paulo, reúnem-se
mensalmente faz mais de 50 anos para
relembrar aqueles momentos dramáticos, mas que forjaram uma camaradagem duradoura. Neste mês, em que
se comemora o aniversário do final da
guerra, eu participei desse jantar. Seria
difícil achar maior honra do que esse
convite vindo de brasileiros que enobreceram o nome do sofrido cidadão
deste país.
Ricardo Bonalume Neto é repórter e colunista
da Folha e autor de "A Nossa Segunda Guerra
-Os Brasileiros em Combate, 1942-1945" (Expressão e Cultura, Rio de Janeiro, 1995). Hoje, excepcionalmente, não é publicado o artigo de Otavio
Frias Filho, que escreve às quintas-feiras nesta
coluna.
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