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TENDÊNCIAS/DEBATES
O governo brasileiro deve retomar
as obras da usina nuclear de Angra 3?
SIM
O momento do sim é agora
OTHON PINHEIRO DA SILVA
O SISTEMA ELÉTRICO brasileiro
é um caso único no mundo.
Cerca de 90% de toda a eletricidade produzida no país é de fonte
hídrica. É uma dádiva da natureza
que depende dos ciclos dessa própria
natureza. A vazão dos rios varia nas
estações de cada ano e anos secos
ocorrem em ciclos de cinco a dez
anos. Foi o caso de 2001, ano do "apagão". Para fazer frente a esses ciclos
naturais é necessário ter uma "poupança de água" em lagos reservatórios. É a forma de garantir a estabilidade da potência hidrelétrica.
Nos últimos 20 anos, a geração das
hidrelétricas vem crescendo, mas
praticamente sem aumento no volume dos reservatórios. Essa tendência
vai se agravar no futuro. Grandes reservatórios na Amazônia são inviáveis do ponto de vista social e ambiental. E é para lá o caminho incontornável da expansão do sistema. Teremos
cada vez menos "poupança".
Por isso vivemos uma "transição
hidrotérmica". Desde o fim dos anos
90, temos de usar cada vez mais usinas térmicas para entrar na seca com
os reservatórios cheios.
O imenso potencial hídrico do país
permitirá que a hidroeletricidade renovável permaneça por muitas décadas como a principal componente do
portfólio de fontes do sistema elétrico. Mas a complementação térmica
será cada vez mais imprescindível.
A expansão da contribuição de outras fontes renováveis -eólica, solar e
biomassa- deverá ser a máxima possível. Porém todas as fontes renováveis dependem dos ciclos da natureza
e requerem complementação térmica
para os períodos em que não estão
plenamente disponíveis.
O Brasil foi também privilegiado
pela natureza com fontes térmicas.
Temos urânio, carvão, biomassa, gás
natural e petróleo. Fator de utilização, abundância em território nacional, logística de aprovisionamento,
preço, impacto ambiental e outros
usos (transporte, indústria) determinarão a contribuição relativa de cada
uma para a complementação térmica.
O urânio não tem outro uso fora a
geração elétrica. O Brasil possui a sexta maior reserva de urânio do mundo,
tendo prospectado só um terço de seu
solo e apenas na camada superficial
(100 metros). As cerca de 250 mil toneladas das jazidas de Lagoa Real
(BA) e Santa Quitéria (CE) correspondem ao dobro de todas as reservas
de gás da Bolívia.
A essa riqueza, soma-se a riqueza
intelectual conquistada pelos brasileiros. Temos o domínio de todas as
etapas de produção do combustível
nuclear e capacitação em projeto,
construção e operação de usinas nucleares. É um patrimônio tecnológico
disponível em pouquíssimos países.
O preço do MWh gerado por Angra
3 estimado pelo MME (Ministério
das Minas e Energia) e já apresentado
ao CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) é de R$ 138,14. É um
valor inferior ao preço máximo atingido por usinas térmicas no leilão de
energia da Aneel (Agência Nacional
de Energia Elétrica) de dezembro (R$
140). O investimento por kW médio a
ser gerado por Angra 3 é de R$ 7.000,
dentro da faixa das novas hidrelétricas oferecidas nesse mesmo leilão
(R$ 5.500 a R$ 8.500).
Dotada de um sistema de instrumentação e controle digital, Angra 3
será construída com base nas mesmas tecnologias de mais de 30 usinas
nucleares em construção hoje no
mundo. Sua operação terá um mínimo impacto sócio-ambiental em termos de uso do solo, necessidade de
novas linhas de transmissão e produção de gases de efeito estufa.
Próxima aos maiores centros consumidores, terá importante contribuição para a estabilidade do sistema
elétrico nacional.
Como no caso de Angra 1 e Angra 2,
os rejeitos gerados pela operação de
Angra 3 serão armazenados de forma
segura e fiscalizada em depósitos
dentro da própria central nuclear, ao
longo de toda a sua vida útil, que é de
60 anos. Esse prazo será mais que suficiente para que a CNEN (Comissão
Nacional de Energia Nuclear), responsável legal pela disposição definitiva dos rejeitos nucleares no país,
implante repositórios com base na
melhor tecnologia disponível no momento em que esses se fizerem indispensáveis. Providências para isso já
estão sendo tomadas, em convênio
com a Eletronuclear.
O Plano Decenal de Expansão de
Energia do MME 2006-2015 planeja
a operação de Angra 3 para 2013. Seu
prazo de conclusão é de seis anos e
meio. Fazendo as contas, estamos
exatamente no momento do sim.
OTHON PINHEIRO DA SILVA, 67, engenheiro naval, diretor-presidente da Eletronuclear, foi o gerente responsável de 1979 a 1994 pelo Programa de Enriquecimento de
Urânio com Ultracentrífugas Brasileiras e pelo Programa
de Propulsão para o Submarino Nuclear Nacional.
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