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CLÓVIS ROSSI
Não dá para relaxar
FRANKFURT - O policial federal
de plantão no aeroporto de Cumbica deve ser leitor desta Folha. Vê
meu nome no passaporte e logo comenta: "Notícia não te falta, hein?".
Depois emenda com um comentário absolutamente impublicável sobre o "relaxa e goza" da ministra
Marta Suplicy.
Não foi o único, publicável ou
não, ouvido na interminável fila para, primeiro, passar a checagem de
segurança e, em seguida, o controle
de passaportes. A maioria dos comentários não vem cravado de indignação, mas de desprezo ou ironia, muitas vezes cruel.
Deveria haver uma lei obrigando
executivos públicos, de todos os níveis, a viver um dia ao mês (ou a cada dois meses, vá lá) como gente
normal. Nada de carro oficial com
motorista, nada de avião da FAB,
nada de "aspones" para fugir das filas ou para pagar contas onde quer
que seja, nada de privilégios.
Talvez assim -só assim- seriam
evitados comentários tão imbecis
como o da ministra do Turismo. O
avião atrasa quase duas horas para
decolar, pois, diz o piloto, o controle aéreo de Brasília não o liberou.
Mergulho na leitura de bordo
que minha premonitória filha me
emprestou. Chama-se "A Distância
entre Nós", da indiana-americana
Thrity Umrigar. Trata-se da história de duas mulheres, patroa e empregada, unidas por forte amizade,
mas separadas pela fronteira invisível da diferença de classe.
Digo premonitória porque o título poderia ser perfeitamente uma
alusão ao abismo que separa mortais comuns das autoridades públicas. Até eu, parte da elite e que posso tratar todas elas de "tu a tu", como dizem os espanhóis, sinto-me
de outro planeta.
Ainda mais que, na chegada a
Frankfurt, há um bom número de
funcionários da Lufthansa a postos
para acomodar passageiros que
perderam sua conexão por causa do
atraso em Cumbica. Nenhum deles
diz "relaxa e goza".
crossi@uol.com.br
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