São Paulo, quarta-feira, 17 de junho de 2009

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Imprevidência


Nova reforma seria meio de conciliar demandas legítimas na Previdência e evitar lesões ao erário em debate no Congresso

CUMPRE-SE o desabafo do presidente Lula, feito na virada de 2007 para 2008 a propósito da derrota da proposta de prorrogar a CPMF. A partir dali, dizia-se no círculo presidencial, o governo não mais se empenharia por reforma constitucional nenhuma.
Evidentemente, a ausência de reformas estruturantes no Congresso, de lá para cá, não se deve à amargura do Planalto com aquela derrota. Foi o resultado, na verdade, de uma acomodação interessada do governo Lula ao longo do segundo mandato.
O crescimento da economia e da receita tributária ofereceu ao Executivo federal, e com fartas sobras, o que o fim do imposto do cheque negou. A popularidade presidencial subiu e estacionou em níveis historicamente elevados. Com esses dois ativos -e imbuído do propósito de fabricar uma candidata à sucessão-, o governo Lula adotou uma rotina de "administração das coisas", no Congresso e na sociedade, orientada a distribuir fundos e poder a fim de evitar atritos.
Do PMDB ao funcionalismo federal, de prefeitos a governadores, de empreiteiras a grandes grupos de telefonia, foram muitos os setores beneficiados nessa grande aposta no apaziguamento político. Mas uma conspiração silenciosa, em nome de uma fatia de aposentados esquecida na distribuição das "bondades" presidenciais, ameaça romper essa "pax" e, com ela, o equilíbrio fiscal nos próximos anos.
Tramitam no Congresso ao menos cinco propostas que, aprovadas, representariam gasto adicional de R$ 100 bilhões já no próximo ano. Pretende-se, por exemplo, derrubar o chamado fator previdenciário, base da reforma implantada ainda no governo FHC, e derrubar um veto de Lula que impediu a correção de todas as aposentadorias do INSS pelo mesmo índice atribuído ao salário mínimo.
Na hipótese da aprovação do pacote de generosidades dos congressistas, sempre à custa do dinheiro alheio, de um ano para o outro o governo seria obrigado a aumentar a sua receita em 14% só para arcar com a despesa nova. Os efeitos ao longo do tempo, dada a crescente parcela de aposentados na população, seriam ainda mais desestruturantes.
A abordagem minimalista do governo, voltada a apagar incêndios localizados sem levantar celeumas, é um risco nesse caso. Na pior hipótese, motivações eleitoreiras atropelam a resistência de setores do Executivo e o fardo recai, como sempre, sobre os contribuintes e as futuras gerações. No melhor desfecho, perde-se uma oportunidade de equacionar, com responsabilidade, duas demandas legítimas.
Pois não há dúvidas de que a renda dos aposentados do INSS que recebem acima de um salário mínimo tem sido menos beneficiada pelas políticas previdenciárias nos últimos anos. Tampouco se pode ignorar o imperativo de preparar, desde já, o sistema de pensões para a nova realidade demográfica à porta.
Abrir um novo capítulo da reforma da Previdência seria, portanto, o melhor meio de conciliar essas duas necessidades. Nada, infelizmente, que esteja no horizonte dos 18 meses de mandato que restam ao presidente Lula.


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