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BORIS FAUSTO
A estabilidade da
América do Sul
O ministro José Dirceu fez uma
exposição franca na sessão de encerramento do 4º Foro Iberoamérica,
que se realizou há pouco mais de uma
semana em Campos do Jordão. Como
se viu nos dias seguintes, a fala do ministro teve forte repercussão. Não é
para menos. Dirceu pintou um quadro de extrema gravidade, existente
em alguns países da América do Sul, e
defendeu a tese de que os governos do
continente deveriam se encaminhar
para a integração militar e o fortalecimento das Forças Armadas.
Foi além e disse que, se não tivermos
a disposição de tomar essas iniciativas, os Estados Unidos acabarão intervindo diretamente no continente. A
Colômbia seria a escolha preferencial
e, com isso, a Amazônia brasileira estaria em perigo.
Não creio que o risco de intervenção
direta americana seja provável. De um
lado, a América do Sul não é uma área
prioritária nas preocupações do governo Bush; de outro, considerando-se o fantástico equívoco da aventura
iraquiana, a instabilidade do mundo
árabe, as preocupações com a Coréia
do Norte etc., tudo indica que a intervenção dos Estados Unidos no nosso
continente não irá muito além do
ponto a que chegou.
Mas nem por isso há motivos para
descartar as preocupações. Salvo percursos difíceis de prever, a América do
Sul está se dividindo, do ponto de vista
da estabilidade, em duas áreas principais. Uma delas é formada pelos países do Cone Sul (Argentina, Brasil,
Chile e Uruguai), que, apesar das dificuldades, encaminham-se para a consolidação no plano interno e as boas
relações comuns. A outra área abrange os países andinos, todos eles fonte
de sérios problemas, destacando-se,
nesse particular, a Colômbia, a Bolívia
e a Venezuela.
Nos últimos anos, uma salutar aproximação ocorreu entre os países do
Cone Sul. Brasil e Argentina caminham juntos em muitos pontos, inclusive no plano da defesa. Depois de estarem à beira de uma guerra pela posse de terras da Antártida, Argentina e
Chile entraram no caminho do entendimento, não obstante alguns arranhões. A aproximação facilita que se
fixe uma agenda de iniciativas supranacionais no continente, absolutamente necessária diante de um quadro cuja gravidade não é necessário
sublinhar.
O problema, entretanto, consiste
em estabelecer o conteúdo dessa
agenda. No passado remoto ou recente, tivemos capacidade de resolver
problemas de fronteira, desde o caso
das Missões -território disputado
por Brasil e Argentina no fim do século 19- até a pacificação entre Peru e
Equador, mediada pelo governo Fernando Henrique, passando pelos
acordos entre a Argentina e o Chile.
Mas agora os problemas são internos e vão muito além das questões de
território. Será preciso muito engenho, perícia e sorte para ajudar a reequilibrar a Colômbia, às voltas com a
guerrilha, o narcotráfico e os paramilitares; a Venezuela dividida ao meio;
ou a Bolívia, que corre o risco da fragmentação, às voltas com um gravíssimo problema social, étnico e regional.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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