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São Paulo, segunda-feira, 17 de novembro de 2003

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BORIS FAUSTO

A estabilidade da América do Sul

O ministro José Dirceu fez uma exposição franca na sessão de encerramento do 4º Foro Iberoamérica, que se realizou há pouco mais de uma semana em Campos do Jordão. Como se viu nos dias seguintes, a fala do ministro teve forte repercussão. Não é para menos. Dirceu pintou um quadro de extrema gravidade, existente em alguns países da América do Sul, e defendeu a tese de que os governos do continente deveriam se encaminhar para a integração militar e o fortalecimento das Forças Armadas.
Foi além e disse que, se não tivermos a disposição de tomar essas iniciativas, os Estados Unidos acabarão intervindo diretamente no continente. A Colômbia seria a escolha preferencial e, com isso, a Amazônia brasileira estaria em perigo.
Não creio que o risco de intervenção direta americana seja provável. De um lado, a América do Sul não é uma área prioritária nas preocupações do governo Bush; de outro, considerando-se o fantástico equívoco da aventura iraquiana, a instabilidade do mundo árabe, as preocupações com a Coréia do Norte etc., tudo indica que a intervenção dos Estados Unidos no nosso continente não irá muito além do ponto a que chegou.
Mas nem por isso há motivos para descartar as preocupações. Salvo percursos difíceis de prever, a América do Sul está se dividindo, do ponto de vista da estabilidade, em duas áreas principais. Uma delas é formada pelos países do Cone Sul (Argentina, Brasil, Chile e Uruguai), que, apesar das dificuldades, encaminham-se para a consolidação no plano interno e as boas relações comuns. A outra área abrange os países andinos, todos eles fonte de sérios problemas, destacando-se, nesse particular, a Colômbia, a Bolívia e a Venezuela.
Nos últimos anos, uma salutar aproximação ocorreu entre os países do Cone Sul. Brasil e Argentina caminham juntos em muitos pontos, inclusive no plano da defesa. Depois de estarem à beira de uma guerra pela posse de terras da Antártida, Argentina e Chile entraram no caminho do entendimento, não obstante alguns arranhões. A aproximação facilita que se fixe uma agenda de iniciativas supranacionais no continente, absolutamente necessária diante de um quadro cuja gravidade não é necessário sublinhar.
O problema, entretanto, consiste em estabelecer o conteúdo dessa agenda. No passado remoto ou recente, tivemos capacidade de resolver problemas de fronteira, desde o caso das Missões -território disputado por Brasil e Argentina no fim do século 19- até a pacificação entre Peru e Equador, mediada pelo governo Fernando Henrique, passando pelos acordos entre a Argentina e o Chile.
Mas agora os problemas são internos e vão muito além das questões de território. Será preciso muito engenho, perícia e sorte para ajudar a reequilibrar a Colômbia, às voltas com a guerrilha, o narcotráfico e os paramilitares; a Venezuela dividida ao meio; ou a Bolívia, que corre o risco da fragmentação, às voltas com um gravíssimo problema social, étnico e regional.


Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.


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