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Abaixo o lixo visual
ALEXANDRE WOLLNER
Vamos discutir esse assunto para o bem da cidade como um todo, e não só para um segmento. Ou segmentos em separado
INCRÍVEL, logo no meu café da manhã, leio um artigo de meu amigo
de décadas, o publicitário Francesc Petit, "Viva a poluição visual",
publicado nesta Folha no dia 9 de novembro de 2006 (primórdios do século 21). Enfatizo a data pela necessidade de diferenciar do teor do artigo
do meu amigo, que parece ter sido escrito nos séculos 19 e 20.
Primeiro: a atividade publicitária
acompanha a evolução criativa, tecnológica e científica universal e vem
exigindo uma linguagem mais criativa, usando mídias contemporâneas
adequadas para uma veiculação tecnicamente mais evoluída, respeitando a integração com a comunidade
sem agredi-la.
Se, no século 19, a litografia, como
diz o meu amigo, surge permitindo
reproduzir cartazes, é porque, nessa
época, era tecnologicamente viável
apenas esse meio. Não existia, além
dos jornais e revistas, outras possibilidades. Mais tarde, no princípio do
século 20, vêm o rádio e, logo em seguida, o cinema. Depois, na segunda
metade, a informática, a TV.
Segundo: os exemplos de cartazes
de cartazistas franceses, suíços, americanos e alemães (nenhum brasileiro
além do articulista?) que Petit menciona, em sua maioria, tinham finalidades culturais, eram executados por
artistas renomados e eram colocados,
respeitando o ambiente urbano, para
serem vistos por pedestres, carroceiros com suas mulas e veículos com
pouca mobilidade nas cidades. Cartazes culturais afixados em muros urbanos como "pissoirs redondos", em
teatros, cinemas, museus e estações
de metrô, muito bem posicionados e
sem encher o saco de qualquer cidadão por nenhum tipo de intervenção
agressiva urbana. Isso já no século 19.
Terceiro: se o articulista visitar Paris hoje, início do século 21, também
dando um pulo (se tiver tempo) em
Nova York, Londres, Berlim, Tóquio,
Zurique, Buenos Aires e até no Rio de
Janeiro, verá que a poluição visual está restrita a um centro especifico (Times Square, por exemplo). Não está
na cidade como um todo! Isso faz parte da legislação urbana dessas cidades
-é oficial e ninguém chia.
Toda cidade tem de ter um plano
diretor feito pela comunidade como
um todo e de comum acordo, não só
pelos publicitários e locatários de espaços urbanos.
São Paulo é horrível arquitetônica
e urbanisticamente falando, e os publicitários usam o argumento de que
a cidade precisa ser escondida visualmente de seus habitantes. Nesses termos, até estou de acordo com ele.
Mas, aí, precisaremos conversar com
os urbanistas e os arquitetos responsáveis pelos projetos de apartamentos e centros de moda de luxo no padrão do estilo do "classicismo francês", jardins como a praça Roosevelt
(quem tem coragem de entrar nela?),
praça da Sé, praça da República etc.
São Paulo tem de ser visível como é
realmente. Não temos de escondê-la.
Talvez a comunidade fique ciente e
vamos discutir como melhorar.
Quanto ao outdoor, percebemos
que a função foi totalmente desvirtuada. Petit fala com conhecimento
de causa quando diz que o cartaz deve
ser explicativo no tempo máximo de
três segundos (telegráfico) para ser
percebido e memorizado. Mas de que
cartazes ele está falando? Dos que estão aí nas ruas e avenidas?
Você, caro leitor, ontem, quando
voltou do escritório para casa, de carro, atravessando várias ruas, praças e
avenidas, me diga: Qual cartaz você
memorizou? Anotou o número de telefone, o e-mail, o site, o número de
prestações e as inúmeras qualidades
e informações?
Nesse trânsito caótico, memorizar,
quanto mais anotar, não dá. A maioria dos cartazes atualmente veiculados praticamente são executados
sem preocupações tecnológicas, inclusive por questões econômicas, por
quase todos os escritórios de publicidade, como se fossem um grande
anúncio de varejo, ampliado aleatoriamente, colocado no contexto urbano em qualquer suporte viável e de
maneira inadequada.
A produção criativa de cartazes urbanos é necessária pelos valores culturais, sociais e econômicos, mas eles
devem ser usados de maneira ética e
responsável, integrada respeitosamente ao contexto que envolve a comunidade, sem agredi-la. Precisamos
cultivar e administrar essa cultura e
reconhecer que profissionais poderão enfrentar esse problema de maneira satisfatória.
Vamos discutir esse assunto para o
bem da cidade como um todo, e não
só para um segmento. Ou segmentos
em separado.
ALEXANDRE WOLLNER, 78, designer, é sócio-proprietário da Wollnerdesigno.
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