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TENDÊNCIAS/DEBATES
Mais do que nunca, escutar o povo
EDUARDO MATARAZZO SUPLICY
Os presidentes do Senado e da Câmara, diante do clamor popular, podem tomar a iniciativa de rever a decisão de aumentar os salários
NÓS, SENADORES e deputados
federais, somos os representantes do povo de cada um dos
Estados e do Distrito Federal. Temos
a atribuição constitucional de legislar, fiscalizar os atos do Executivo e
expressar os sentimentos da população de tristeza, alegria, angústia, felicidade, indignação, aflição. Os congressistas mais sintonizados com os
anseios do cidadão são normalmente
os mais bem votados nas eleições.
Há momentos durante o mandato
em que precisamos tomar decisões de
grande responsabilidade, que correspondam às expectativas daqueles que
nos confiaram seus votos. Entre essas
está a de definir, a cada período legislativo, a remuneração dos parlamentares, bem como dos serviços de que
poderá dispor para auxiliar o exercício de seus mandatos. Isso representa
despesas com funcionários de carreira e de confiança, com cotas de telefone, correio, transporte de avião ou de
deslocamento por terra, internet, entre outras.
Na última quinta-feira, as Mesas do
Senado e da Câmara dos Deputados
tomaram a decisão de aumentar o salário dos senadores e deputados federais para R$ 24.500 por mês, correspondendo a um reajuste de 91% em
relação ao salário atual, de R$ 12.700.
Na manhã daquele mesmo dia,
transmiti aos presidentes Renan Calheiros (PMDB-AL) e Aldo Rebelo
(PC do B-SP), do Senado e da Câmara,
respectivamente, e à líder do PT no
Senado, Ideli Salvatti (SC), que seria
de bom senso um reajuste que correspondesse ao valor da inflação de janeiro de 2003 a janeiro de 2007, da
ordem de 28,5%, significando uma remuneração de R$ 16.500. Creio que
essa medida seria compreendida pela
população.
A decisão tomada pelas Mesas da
Câmara e do Senado provocou uma
fortíssima reação da opinião pública.
Acredito que todos os parlamentares,
assim como eu, tenham recebido uma
enxurrada de mensagens -por correio eletrônico, telefone, cartas e até
pessoalmente- de protesto diante do
aumento considerado abusivo, tendo
em conta o que se passa com a remuneração do conjunto da população
brasileira.
Ainda que o decreto legislativo nš
444, de 2002, disponha que a remuneração dos membros do Congresso
Nacional "corresponderá à maior remuneração percebida, a qualquer título, pelo ministro do Supremo Tribunal Federal" e que as "Mesas do Senado e da Câmara dos Deputados regularão, em ato conjunto, a aplicação"
do respectivo decreto legislativo, os
artigos 48 e 52 da Constituição rezam,
com muita clareza, que a própria remuneração dos parlamentares deverá ser objeto de iniciativa de lei, o que
significa ser aprovada pelo conjunto
dos membros de ambas as Casas.
É bom lembrar que, muito embora
o referido decreto mencione que a remuneração dos membros do Congresso Nacional corresponderá à dos
ministros do Supremo Tribunal Federal, isso não precisa necessariamente ocorrer, tanto é que assim não
aconteceu no período desde 2002,
exatamente porque os congressistas
avaliaram que caminhar celeremente
naquela direção iria provocar uma
reação muito forte da opinião pública.
Mais adequado será não haver ajustes nos salários dos ministros do STF
até que se chegue à equiparação dos
vencimentos dos postos mais altos
dos três Poderes, o que poderá ocorrer no momento em que as finanças
públicas estiverem melhor e houver a
compreensão de que os níveis de remuneração estejam mais de acordo
com o que acontece com o conjunto
da sociedade e as responsabilidades
dos respectivos cargos.
Avalio que os presidentes do Senado e da Câmara, diante do clamor popular, podem perfeitamente tomar a
iniciativa de rever a decisão anunciada. É importante que a população e
todos os senadores e deputados sejam
ouvidos, e não apenas as lideranças.
Será bom para o país que todos possam dialogar e, principalmente, ouvir
os seus representados, para que, nesta próxima semana, seja encontrada
uma solução que reflita melhor a vontade de todos os brasileiros. E será
muito melhor para a própria tranqüilidade da Mesa Diretora que venha a
submeter a sua decisão ao plenário do
Congresso Nacional.
EDUARDO MATARAZZO SUPLICY, 65, doutor em economia pela Universidade Estadual de Michigan (EUA), professor da Eaesp-FGV, é senador da República pelo PT-SP. É autor do livro "Renda de Cidadania - a Saída é Pela Porta", entre outras obras.
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