São Paulo, domingo, 18 de janeiro de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

Tal como antes

RIO DE JANEIRO - A acreditar no noticiário da semana que passou, Brasil, Argentina e Venezuela fizeram bonito em Monterrey ao obrigarem os Estados Unidos a um recuo na Cúpula Extraordinária das Américas, reunida naquela cidade mexicana.
Tenho uma estranha afinidade com essas reuniões. Numa delas, em Punta del Este, assisti à expulsão de Cuba da OEA, o discurso irônico de Che Guevara, dizendo que a Aliança para o Progresso proposta por Kennedy limitava-se a uma verba para construção de latrinas.
Anos mais tarde, aqui no Rio, não assisti a nenhuma reunião, porque fui com amigos para porta do hotel Glória protestar contra o governo militar daquela época. Só tomei conhecimento da manchete que um jornal argentino publicou: "Patearan el mariscal". Na PE da rua Barão de Mesquita, Antônio Callado traduziu para nós: "Vaiamos o marechal".
O tempo passou e parece que alguma coisa mudou, pelo menos para o nosso lado. Os norte-americanos, que em 1961 haviam proposto a expulsão de Cuba do sistema pan-americano, querem agora expulsar os países corruptos do mesmo sistema. No passado, para os EUA, corrupção era ser de esquerda. O chanceler do Haiti, que representava a ditadura mais corrupta do hemisfério, foi o porta-voz de Foster Dulles na reunião, da qual ele nem quis participar, ficando na sua suíte do hotel San Rafael.
Agora é o próprio Bush que dispensa os chanceleres e dá o seu recado aos demais presidentes. Três deles reagiram à altura. Afinal, quem estabelece qual o país ou quais os países são corruptos? Quem separa o joio do trigo?
Tal como em 1961, o propósito da política norte-americana é isolar a Venezuela, a Colômbia e talvez o próprio Brasil, preparando o terreno para um novo e gigantesco bloqueio continental à economia dos países não alinhados integralmente à sua política de hegemonia mundial.


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