São Paulo, segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

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Editoriais

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Esconde-esconde

Sociedade perde quando candidatos, por mera conveniência eleitoral, silenciam sobre temas de interesse nacional

"IREMOS MEXER na taxa de juros, no câmbio e nas metas de inflação. Essas variáveis continuarão a reger nossa economia, mas terão pesos diferentes. Nós não estamos de acordo com a taxa de juros que está aí, com o câmbio que está aí. Estamos criando empregos no exterior. Os últimos resultados da balança comercial são negativos. (...) Será necessário fazer um rigoroso ajuste das contas públicas. Hoje o governo gasta muito -e mal."
São palavras do presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), em recente entrevista à revista "Veja". É implausível que as críticas à condução da economia não tenham sido discutidas antes com o provável candidato tucano à sucessão presidencial, José Serra. Até porque o governador é um crítico assíduo dessa política econômica.
A entrevista, porém, deflagrou um mal-estar no tucanato, sobretudo naquele núcleo mais próximo de Serra. Sérgio Guerra teria, na avaliação interna, errado na dosagem da crítica, abrindo espaço para que a candidatura tucana seja vista pelos agentes econômicos como um risco à estabilidade. Numa inversão anedótica dos papéis desempenhados na campanha de 2002, Serra, e não mais Lula, seria agora o mensageiro da desordem.
Ora, se existe algum problema de fundo nesse episódio, ele não deriva das posições externadas pelo presidente do PSDB, mas da falta de clareza e da pouca disposição do virtual candidato quando se trata de submeter suas ideias a escrutínio público.
É fácil perceber o jogo de esconde-esconde que envolve os principais protagonistas da sucessão. Em parte, o comportamento esquivo, cauteloso e até vacilante se explica pelas conveniências do calendário eleitoral, pela preocupação de não antecipar embates inevitáveis.
Ocorre que, à luz dos interesses do esclarecimento da população e da própria vitalidade da democracia, trata-se justamente de desalojar os postulantes ao cargo mais alto da República de seus respectivos castelos e convocá-los para o debate mais franco. Ou ainda não seria a hora?
Ainda há pouco, o governo Lula fez esforço para eximir a Casa Civil, comandada por Dilma Rousseff, de suas responsabilidades sobre o texto do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos. Após reformas em pontos polêmicos do decreto, a crise provocada pelo documento se encaminha para um desfecho sem que se saiba, ainda, o que pensam a respeito da chamada comissão da verdade nem a ministra -ex-militante de um grupo adepto da luta armada- nem Serra, que se exilou em 1964.
Louve-se, nesse sentido, o comportamento de Marina Silva, virtual candidata à Presidência pelo PV, que fez restrições à atuação da Casa Civil e se posicionou favoravelmente à criação da comissão para investigar violações de direitos humanos durante a ditadura. A senadora acrescentou, ainda, que a eventual revisão da Lei da Anistia é algo que cabe ao Judiciário decidir.
Dos debates pontuais às questões de maior abrangência e relevância, é tempo de exigir maior comprometimento público de quem almeja presidir o país.


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