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ELIANE CANTANHÊDE
Namorando o perigo
BRASÍLIA - O presidente da República, o primeiro-ministro e o homem
forte da economia não podem mais
abrir a boca. Responder a perguntas,
então, nem se fala.
O próprio Lula entrou pelos fundos
do hotel Copacabana Palace e, no dia
seguinte, saiu escoltado de ministros,
diplomatas, assessores e seguranças
para não ouvir manifestações nem
perguntas desagradáveis. Entrou e
saiu calado do encontro com Néstor
Kirchner -que, aliás, deu entrevista
para os jornalistas argentinos.
Na comitiva de Lula porta afora do
Copacabana, um constrangido Palocci limitou-se a dar um riso amarelo ao igualmente sair de fininho sem
falar nada. Enquanto os ministros
argentinos circulavam entre os jornalistas, falando à vontade.
São efeitos da crise. Ou melhor: da
fita que flagrou Waldomiro Diniz pedindo grana a um bicheiro e da suspeita de que o mesmo Waldomiro
meteu Rogério Buratti numa renovação de contrato da CEF. Waldomiro
era braço direito de Dirceu. Buratti,
demitido por Palocci em 94 por causa
de mutretas, continuou prestando
serviços não só para a Prefeitura de
Ribeirão Preto como para outras do
PT. E surge agora numa triangulação como essa, já no governo Lula.
Cada vez que Lula, Dirceu e Palocci
se aproximarem de jornalistas -pode ser em encontro com Kirchner,
reunião de agricultores ou concurso
de miss-, eles não vão escapar da
maldade dos microfones: "E o Waldomiro?", "e o Buratti?".
Se tentam se limitar a discursos políticos, correm o risco de pensar alto
demais, de abrir a alma e de destilar
raiva. Talvez tenha sido o caso de
Dirceu, que aproveitou uma reunião
com prefeitos na terça para fazer um
discurso inflamado, indignado e, de
certa forma, ameaçador.
Dirceu acusou a oposição de "namorar o perigo". Sinto muito, mas
quem anda namorando o perigo são
o próprio Dirceu e, aparentemente,
Palocci. Até por isso, aliás, nem o presidente nem os ministros podem dar
entrevistas. As perguntas, todo mundo sabe quais são. E as respostas?
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