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CARLOS HEITOR CONY
O prazer dos deuses
RIO DE JANEIRO - Durante os 24 anos de sua existência, o PT contou
com o apoio de intelectuais, artistas e
mídia, sem falar, é claro, na adesão
progressiva e fanática de imensas
parcelas das classes média e baixa da
sociedade brasileira.
Assumindo o figurino de vestal, o
partido habituou-se a proclamar
suas qualidades, atribuindo-se o monopólio da moral e da compostura.
Na oposição, era relativamente fácil manter a imagem que o próprio
partido criou para si. No entanto,
desde o início, a sua trajetória teve
incidentes não apenas duvidosos,
mas moralmente reprováveis. Roubos de caixa, delações, patrulhamentos, o elenco tradicional de qualquer
partido, de qualquer instituição humana. Até mesmo crimes de morte.
Daí a perplexidade do PT diante
das cobranças da própria mídia, que
tanto o incensou no passado, e de
grande parte de seus membros, desiludidos com os rumos do partido no
poder.
Volta e meia, ouve-se a queixa de
um dos cardeais petistas na base do
"até tu, Brutus?", estranhando a crítica ou a condenação de um aliado,
de um simpatizante, inconformado
com a nova face do PT, em tudo semelhante aos demais partidos que
eram acusados de pilantragem, fisiologismo e demagogia.
Em sua versão atual, o PT se expressava na arena política, econômica e administrativa pela "troika" formada por Lula, Dirceu e Palocci. Os
últimos acontecimentos pegaram
Dirceu e sobraram um pouco para
Palocci. Lula continua resguardado,
mas está pagando e pagará um preço
cada vez mais alto pela redoma criada em torno dele.
O eixo do poder político passou para Sarney, tarimbado na vida pública, que também pagou o preço do
apoio de Ulysses Guimarães em seu
período presidencial. Não se trata de
uma vingança, prazer dos deuses,
mas das circunstâncias criadas pelo
destino.
Há um pouco de ironia nisso tudo,
mas a política não deixa de ser uma
farsa levada a sério. E ninguém como
Sarney sabe disso.
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