São Paulo, terça-feira, 18 de maio de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Os preços dos combustíveis no Brasil
ADRIANO PIRES e LEONARDO CAMPOS FILHO
Entretanto, na nossa opinião, essas considerações são por demais genéricas e estão longe de invalidar por si sós as comparações realizadas com os preços do golfo. Para melhor fundamentar nosso ponto de vista e explicar como funciona um mercado verdadeiramente livre, tomamos o exemplo do comportamento dos preços da gasolina e do diesel nas refinarias americanas. É bom lembrar que escolhemos os EUA pelo fato de ser o maior mercado do planeta, por sofrer efetivamente pressões competitivas e comercializar com vários fornecedores espalhados pelo mundo. Sendo assim, quando observamos o mercado americano no período de janeiro de 2003 a janeiro de 2004, verificamos que os preços da gasolina e do diesel acompanharam a tendência dos preços spot no golfo. Ou seja, durante quase todo o ano de 2003, precisamente entre abril e julho e entre setembro e dezembro, os preços das refinarias nos EUA também estiveram abaixo dos praticados pela Petrobras no Brasil. Na realidade, o que se verifica é que, enquanto os preços da gasolina e do diesel, tanto no golfo do México como nas refinarias nos EUA, variam de acordo com o comportamento do mercado internacional do petróleo, os preços da Petrobras praticamente não mantêm relação direta com esses mercados. Apesar da abertura do mercado de combustíveis, os preços da gasolina e do diesel são determinados por fatores de origem macroeconômica ou eleitoral. Em 2002, ainda no governo FHC, o CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) autorizou a ANP (Agência Nacional do Petróleo) a intervir no preço do gás de cozinha durante a campanha presidencial. Em 2003, primeiro ano do governo Lula, a política de preços dos combustíveis foi utilizada como instrumento para atingir a meta do superávit fiscal acordada com o FMI. Por isso, os preços da gasolina e do diesel quase sempre estiveram acima do mercado internacional e a Petrobras realizou o maior lucro da sua história. Em 2004, o preço do petróleo, contrariando o esperado por diversos analistas, tem apresentado uma forte trajetória ascendente. A conseqüência desse cenário para a Petrobras tem sido a redução de suas margens de refino. Depois de atingir US$ 11/barril de petróleo em 2003, essa margem, entre abril e maio deste ano, já aponta para valores abaixo de US$ 3/barril. Aparentemente, em 2004 os preços dos combustíveis estão submetidos a interesses políticos, com a aproximação das eleições municipais. O fato de os preços da Petrobras serem utilizados para atingir metas macroeconômicas e políticas e, dessa forma, não oscilarem de acordo com os preços internacionais, permanecendo por períodos de tempo consideráveis ora abaixo, ora acima do patamar externo, inibe a atuação dos importadores, a entrada de novos agentes na atividade de refino no Brasil e impede a existência de um mercado competitivo. Enquanto a Petrobras detiver uma posição dominante no Brasil, sendo proprietária de cerca de 96% da capacidade de refino, responsável pela maior parte das importações e dona da logística de terminais nos principais centros de consumo, é essencial que a empresa disponibilize mais informações acerca dos preços cobrados (por refinaria e derivados, por exemplo) e que a sua política de livre acesso aos terminais seja rotineiramente avaliada pela ANP e pelas entidades de defesa da concorrência. O objetivo não é obrigar a Petrobras a divulgar segredos corporativos, mas dar uma maior transparência à política de preços dos combustíveis. Essa transparência é fundamental para a criação de um ambiente regulatório, baseado em um mercado competitivo, para os derivados de petróleo e demais fontes de energia, em particular as renováveis. A construção desse ambiente estável para o mercado de combustíveis favorece também a própria Petrobras, que atualmente não pode tomar decisões observando o comportamento dos mercados, já que se encontra refém ora da política macroeconômica, ora de interesses eleitorais. Adriano Pires Rodrigues, 46, economista, é diretor do CBIE (Centro Brasileiro de Infra-Estrutura) e professor da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da UFRJ. Leonardo Campos Filho, 36, economista, é consultor-associado do CBIE. Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Roberto Luis Troster: Fantasias Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
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