UOL




São Paulo, sexta-feira, 18 de julho de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

Separando o joio do trigo

ÁLVARO SÓLON DE FRANÇA

Quando da elaboração da Constituição de 1988, uma das grandes preocupações dos constituintes era encontrar uma forma de estimular as entidades beneficentes de assistência social, que havia muito vinham desenvolvendo atividades de cunho social, ocupando espaço que não era preenchido pelo Estado brasileiro. Assim nasceu o parágrafo 7º do art. 195 da Constituição, que reza: "São isentas de contribuições para a Seguridade Social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei".
Para regulamentar o preceito constitucional, a legislação ampliou o conceito de entidades beneficentes de assistência social, permitindo que, principalmente, entidades educacionais de ensino superior pudessem usufruir da isenção das contribuições destinadas à Seguridade Social. Essas entidades passaram a ser conhecidas pela sociedade como entidades filantrópicas. Só no âmbito da Previdência Social, as isenções, denominadas renúncias previdenciárias, provocadas pelas entidades filantrópicas atingirão neste ano R$ 2,18 bilhões, sendo que só as entidades vinculadas à educação respondem por 44% desse valor -ou seja, R$ 959 milhões.
Na realidade, as renúncias previdenciárias nada mais são do que recursos que a sociedade transfere dos cofres da Previdência para as entidades filantrópicas, para que estas, em troca, ofereçam serviços às pessoas carentes que necessitam de assistência social. Mas, infelizmente, muitas entidades não estão sendo corretas na oferta desses serviços. Vale dizer que a ocorrência de desvios acaba maculando a imagem de um número significativo de entidades filantrópicas sérias.


A ocorrência de desvios acaba maculando a imagem de um número significativo de entidades filantrópicas sérias


Numa atitude inédita, a Previdência Social, em parceria com a Receita Federal, está desenvolvendo, neste ano, auditoria fiscal nas 350 maiores entidades filantrópicas isentas das contribuições destinadas à Seguridade Social. Pretendemos verificar se realmente essas entidades estão cumprindo os preceitos legais para usufruírem da isenção das contribuições. Somente essas entidades respondem por 70% das renúncias, o equivalente a R$ 1,52 bilhão. A auditoria fiscal, cumprindo o que a sociedade dela espera, estará sendo rigorosa na separação entre o joio e o trigo. Não se trata de uma caça às bruxas; o que nós precisamos é estabelecer um maior controle sobre essas renúncias, que vêm sendo objeto de desvios em alguns casos.
A fiscalização conjunta do INSS e da Receita Federal pretende livrar as verdadeiras entidades beneficentes de assistência social da companhia indesejável das entidades que se apropriam dos recursos da sociedade e os aplicam em atividades distantes da filantropia.
Em atitude inédita, também divulgamos no site da Previdência Social (www.previdenciasocial.gov.br) a relação de todas as entidades filantrópicas com isenção das contribuições destinadas à Seguridade Social, para que sociedade, legítima proprietária da Previdência, possa controlar se os seus recursos estão sendo aplicados de maneira saudável. O controle social é fundamental para que o caminho percorrido entre os recursos retirados da sociedade e os serviços a ela oferecidos seja transparente.
Na última semana, obtivemos a valorosa compreensão do Congresso acerca da missão que o INSS e o Ministério da Previdência devem desempenhar na fiscalização de isenções às filantrópicas. A previsão de recurso ao ministro da Previdência, quando houver divergência sobre a renovação de isenção previdenciária, protege a sociedade e o Conselho Nacional de Assistência Social, que passa a contar com poderoso instrumento de controle técnico sobre suas decisões.
Creio que, agindo dessa forma, estaremos atendendo ao anseio da sociedade brasileira, que espera que os servidores públicos sejam rigorosos no trato da coisa pública. Como auditor fiscal do INSS há 16 anos, tenho certeza de que minha categoria realiza, neste governo, seu compromisso com o Estado e com a Previdência Social como jamais pôde fazê-lo. Trata-se de uma oportunidade histórica, que não vamos desperdiçar.

Álvaro Sólon de França, 49, é secretário-executivo do Ministério da Previdência Social.


Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES
Sergio Miceli: A universidade pública a perigo

Próximo Texto: Painel do leitor
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.