São Paulo, segunda-feira, 18 de julho de 2011

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VINICIUS MOTA

Vivoli, Europa

SÃO PAULO - Em 1996, o calor do verão toscano era mais um motivo para visitar a sorveteria Vivoli, entre a basílica de Santa Croce e a piazza della Signoria, em Florença. Ao saborear o "gelato", notei o famoso cartão-postal na parede.
O remetente o enviara para "Vivoli, Europa", sem mais dizer do endereço. E no entanto, como prova do renome do lugar, a correspondência chegou à loja acanhada, a poucos passos do teatro Verdi.
Após 15 verões, a crise europeia me fez lembrar o caso. Pensava na provocação atribuída a Henry Kissinger, chefe da diplomacia americana sob Nixon e Ford. Para quem ligo se quiser falar com a Europa?
A derrocada no continente questiona a própria existência do euro. A moeda única é a síntese daquela que talvez tenha sido a maior obra de engenharia política da humanidade. Uma moeda sem país, símile de uma nacionalidade sem nação.
No momento da aflição se vê como esse projeto ainda está no meio do caminho, sujeito a riscos severos. Ninguém responde pela Europa. As instituições comuns cabeceiam, refletindo o desacordo entre seus membros, enquanto, na prática, é a China que segura o euro.
Valeu a pena? A soberba modernização da periferia europeia e a extensão dos padrões centrais de bem-estar, nas últimas três décadas, sugerem que sim. Mas, além de terem ficado ricos, países como a Espanha e a Itália ficaram também competitivos? Serão capazes de assegurar o estilo de vida de suas populações pelos próximos 50 anos? Essa dúvida angustia.
Em 1996, o Brasil tinha uma moeda peculiar. Endividava-se brutalmente para sustentar o real próximo ao dólar. Permitia que jovens bem-nascidos vagassem pela Europa e tomassem sorvete no Vivoli sem dor na consciência. Custou muito manter o real, mas hoje ele faz uma enorme diferença.
Grécia, Itália, Portugal e Espanha aboliram suas moedas nacionais. Por isso vão sofrer mais agora.

vinimota@uol.com.br


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