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ELIANE CANTANHÊDE
Vilão e pobre coitado
BRASÍLIA - Enquanto o PT busca um retorno ao passado, Severino tenta
definir o seu futuro. Sua Excelência
perde os dedos, mas quer salvar os
anéis: as benesses e os cargos da família e dos aliados no governo.
No país dos escândalos de milhões
de dólares nas Bahamas, é um pobre
coitado enrolado com uns trocados.
Quem conhece o casal Severino-Amélia Catarina descreve uma casa razoável em João Alfredo (PE), com
mobília simples, farta comida caseira, filhos e netos adorando uma boquinha, em duplo sentido.
Foi para esses pequenos "luxos" que
Severino se meteu com Lula e extorquia o tal Sebastião Buani. Não para
"enricar", como se diz no Nordeste.
Devia achar tudo tão normal, tão
corriqueiro, que nem sequer se sente
culpado. "Sou um homem honrado",
berra, quase patológico. Deve acreditar mesmo. Danem-se os cheques.
Severino é, portanto, causa e efeito,
réu e vítima de um sistema ultrapassado e nojento que viceja à custa da
dramática desigualdade entre regiões e pessoas neste país. A gente roda, roda, roda e cai no mesmo buraco: a ignorância. Não adianta focar
nele. É preciso olhar o conjunto da
obra.
Sugestão: o livro "A Ética da Malandragem -no Submundo do Congresso Nacional" (Geração Editorial,
2005), com histórias colhidas pelo jornalista Lúcio Vaz quando era da Folha. Ao lê-lo e escrever o prefácio, tudo me pareceu cristalino: a vitória de
Severino foi construída durante anos.
Com mais de 40 anos de vida pública, ele compra os votos com favores,
badulaques, dentaduras. E importou
essa tecnologia para o Congresso.
Empoleirou-se na Primeira Secretaria da Câmara e dali saiu distribuindo as "dentaduras" que o baixo clero
queria. A lambança do PT na eleição
da Mesa e o oportunismo de parte do
PSDB e do PFL fizeram o resto.
Severino é o retrato de boa parte da
Câmara, que é o retrato do Brasil. Se
renunciar, ele vai embora (e já vai
tarde), mas o baixo clero fica, ele volta em 2007 e o Congresso continua o
mesmo. Como o Brasil.
@ - elianec@uol.com.br
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