São Paulo, domingo, 18 de setembro de 2005

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CARLOS HEITOR CONY

A crise e o Sacudo

RIO DE JANEIRO - Poucas vezes na história da mídia universal houve tal e tamanha unanimidade em reprovar o mal e elogiar o bem. Não se trata da burrice banal atribuída a qualquer tipo de unanimidade. Pelo contrário: é um consenso inteligente, e direi mais, um consenso mais do que esforçado. Há uma concorrência feroz na disputa pela "pole position" de quem é ou fica mais indignado.
Nos veículos da mídia, dos principais editores e formadores de opinião ao manobreiro do estacionamento que serve às empresas, todos se declaram estarrecidos, enojados. Nos últimos eventos da semana que passou, com Severino, Maluf e Jefferson afinal justiçados pela cólera geral e, de quebra, com a quebração de cara do Bush nas enchentes de Nova Orleans, houve alívio, a sensação do dever cumprido, "dessa vez vamos" para o reinado da justiça e da moral.
Não pretendo comentar temas tão elevados. Falei acima em manobreiro de estacionamento porque me lembrei do Sacudo, que tomava conta da praça diante do edifício da falida "Manchete", transformada em garagem rotativa e mais ou menos gratuita -cada um dava ao Sacudo o que podia, ele não pedia nada.
O apelido se justificava. Ele sofria de hidrocele, doença que atrapalhava seu passo normal, mas não influía em seu ânimo, sempre alegre e solidário. Sobretudo solidário. Impressionante como assumia a causa dos fregueses, fossem quais fossem as causas e os fregueses. Num Carnaval, sabendo que todas as revistas do grupo tinham torcido pela Mangueira, que acabou em 12º lugar, degolada pela corrupção dos jurados daquele ano, Sacudo era o mais consternado de todos, embora nem fosse mangueirense nem gostasse de Carnaval.
Não sei mais por que estou lembrando Sacudo e sua indignação contra a corrupção reinante. Deve andar por aí, com seu imenso saco, satisfeito porque a justiça parece que está sendo feita.


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