São Paulo, domingo, 18 de setembro de 2005

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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

Um programa que jamais deve ser esquecido

São Paulo é uma bela cidade que, infelizmente, está sendo atacada por pichadores de paredes que praticam um verdadeiro vandalismo contra o patrimônio público e privado. A eles se juntam os que utilizam as praças públicas para dormir, comer, lavar roupa e fazer necessidades. Mais triste é ver a proliferação de menores e adolescentes nos cruzamentos das ruas a pedir esmolas e a vender quinquilharias.
O caso dos menores é muito triste por dois motivos. Primeiro, há a dimensão humana. O lugar de menores é na escola, em casa e em ambientes de lazer sadio. É aí que eles aprendem os valores fundamentais do convívio civilizado. Deixá-los nas ruas é submetê-los a um abandono que certamente irá deformar o seu caráter.
Segundo, há a perversidade da exploração dos adultos. Dados da Prefeitura de São Paulo indicam que a maioria das crianças e adolescentes é aliciada por espertalhões que as levam às esquinas para pedir e vender, delas extraindo, muitas vezes, mais de R$ 500 por mês. Lamentável é que muitos desses espertalhões são os pais.
Esse quadro não pode continuar, pois é um atestado do fracasso da geração adulta, ou seja, de todos nós. Alguma coisa precisa ser feita e pode ser feita. As cidades de Curitiba e Porto Alegre obtiveram um bom resultado ao enfrentar o problema com uma combinação de medidas educativas e assistenciais, como a criação de um fundo de apoio às famílias que exploram seus filhos, o monitoramento dos menores a fim de assegurar que voltem ao lar e à escola, a articulação dos esforços das organizações que se dedicam à educação e assistência social das crianças e adolescentes e outras.
Em São Paulo, o grande desafio reside no fato de os menores ganharem nas esquinas muito mais do que recebem dos programas assistenciais. A prefeitura estima haver 3.000 menores nos cruzamentos da cidade, onde arrecadam cerca de R$ 20 milhões por ano. Isso significa que os adultos que dão esmolas ou compram produtos nas esquinas estimulam os menores a permanecerem nessa indigna condição. Há que se quebrar o círculo vicioso da indústria da indigência, e isso depende da colaboração da população como um todo.
Seria desumano simplesmente negar a ajuda. É preciso transformar a natureza dessa ajuda, tornando-a estimuladora da freqüência à escola e estada em casa. O programa que a Prefeitura de São Paulo pretende implementar a partir de outubro deste ano vai nessa direção. O que se busca é levar os adultos a direcionarem seus recursos para um fundo cujo montante pode chegar a R$ 240 milhões por ano, segundo as estimativas da própria prefeitura.
Está aí uma boa medida, que, na realidade, deveria ter sido tomada há muito tempo. É inaceitável ver os menores sendo explorados na capital mais rica do país assim como é intolerável assistir passivamente à pichação dos prédios e à ocupação das praças públicas. Oxalá o novo programa saia do papel de modo definitivo e continuado, porque esse tipo de ação tem de ser permanente e crescente.


Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.
@ - antonio.ermirio@antonioermirio.com.br


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