São Paulo, segunda-feira, 18 de setembro de 2006

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JOÃO SAYAD

Como fazer um projeto para o Brasil

PROGRAMAS eleitorais de governo não são para valer. Mas existem projetos de boa fé. Na semana passada, o DNA, um "think tank", reuniu-se para discutir diferentes projetos para o Brasil.
Muitos planos esquecem que somos prisioneiros de um sistema, como atores de uma peça clássica. Podemos apenas fazer adaptações, vestindo o Édipo de cantor de rap da periferia ou escolhendo um ator negro como Otelo para o papel de Hamlet.
No caso de planos, a peça é o capitalismo. A versão brasileira começa com o açúcar e escravidão, passa pelo ouro, café, abolição da escravatura e industrialização até 1980. O último ato é a crise de dívida externa e superinflação, Plano Real, sobrevalorização cambial e o governo atual que adiciona juros reais de 10% a saga da estagnação.
Sem discutir este roteirão, não há plano.
Depois, é preciso deixar claro o objetivo final. No momento, falta mais república do que democracia.
República quer dizer muitas coisas: a impessoalidade do espaço público, servidores protegidos do governo da época, direitos iguais, etc. E Justiça- a brasileira usa computador como máquina de escrever.
Já cansamos do tamanho do Estado no papel de vilão. O déficit público é personagem importante, mas seu destino depende tanto da peça quanto a peça do seu destino.
A agenda micro- "business climate", ambiente regulatório, energia, previdência são coadjuvantes. Sem mudar o drama, o ator pode falar o que quiser, mas acaba sempre com o "ser ou não ser".
Apesar de imperfeito, o objetivo tem que ser a taxa de crescimento do PIB. Os governos dos últimos doze anos não gostam de PIB. Se viermos com qualificações (índice de Felicidade, índice de Desenvolvimento Humano) vamos cair na armadilha do discurso que em nome da inflação, acabou com o crescimento. Quando estivermos crescendo a 6% a.a. e depois de muitos anos, poderemos nos preocupar com o aperfeiçoamento da medida.
Por enquanto, não há o que aperfeiçoar.
Não perca tempo com choque de gestão. Grandes organizações são sempre mal geridas. Tente tirar carteira de motorista nos Estados Unidos, reclamar da conta de telefone ou do saldo num grande banco. É igual a repartição pública, ou pior, pois você fala apenas com uma gravação.
Nem se distraia com a educação. Educação no Brasil só é chamada de prioridade porque não é prioridade. Gastamos com juros o dobro do que gastamos com educação.

jsayad@attglobal.net


JOÃO SAYAD escreve às segundas-feiras nesta coluna.


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