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ALÉM DO AJUSTE FISCAL
Nos próximos dias, o governo brasileiro anunciará medidas de redução
de gastos e aumento da arrecadação
de impostos. A coerência e a viabilidade desse ajuste selarão o destino
do Plano Real. As promessas serão
avaliadas pelo FMI, que vai liderar
uma operação de resgate estimada
em cerca de US$ 30 bilhões.
O compromisso com o ajuste fiscal
é a condição necessária para que o
país recupere a confiança dos investidores. Entretanto, vários alertas têm
surgido, sempre sugerindo que essa
condição é de fato necessária, mas
está longe de ser suficiente.
O real tem um valor artificial. Desde
o início do Plano Real, foram cometidos exageros na fixação da sua cotação em relação ao dólar. Na época,
com dólares entrando no país em
abundância, isso era fácil. Agora,
num contexto de escassez de divisas
e retração global do crédito, o artificialismo é mais que suspeito. Ele é
aparentemente insustentável.
No momento há uma ênfase compreensível na dimensão fiscal. Mas a
questão cambial continua presente.
O economista-chefe do Fundo, Michael Mussa, chegou a cogitar de
uma correção cambial no bojo do entendimento entre o Brasil e o FMI.
Na sexta-feira, o tema foi objeto de
uma extensa reportagem no "Wall
Street Journal". Para Milton Friedman, por exemplo, a política cambial
brasileira é uma bomba-relógio.
Mas não é só no exterior que opiniões respeitáveis alertam para a insuficiência de uma política econômica restrita ao ajuste fiscal. No Brasil,
cresce o debate em torno de um Ministério da Produção, anunciado pelo
presidente FHC em seu primeiro discurso após a vitória nas eleições.
Com ou sem o tal ministério, a
questão é a intensidade da recessão
necessária para impedir maiores desequilíbrios das contas externas.
Mais ainda, seja qual for o grau de
contração da economia, há várias
providências que seria possível desenhar. Como na embarcação ou habitação que vai enfrentar uma tempestade, é preciso reforçar janelas, proteger áreas vitais, preparar uma travessia minimamente organizada.
Mesmo com recessão, quais serão
as políticas de defesa da estrutura
produtiva nacional? O FMI, a julgar
pelas exigências da maioria republicana no Congresso dos EUA, condicionará seus empréstimos a uma
abertura comercial ainda maior dos
países sob monitoramento. Perseguir metas nessa área, em meio a
uma recessão, não é trivial.
Infelizmente, tanto na questão
cambial quanto no campo das políticas comerciais e industriais o governo brasileiro mal começava a se organizar quando sobreveio a crise.
Anunciado o ajuste fiscal, obtida a
ajuda externa, provavelmente virão
meses de sacrifício econômico e piora no quadro social. Mesmo que os
juros caiam aos já elevados 20% ao
ano de antes da crise, o estoque da
dívida pública interna aumentou. Ou
seja, o garrote financeiro sobre as
contas do governo pode perdurar.
A recessão torna ainda mais difícil
pensar em desenvolvimento e metas
de longo prazo. A tecnoburocracia
brasileira está mal aparelhada para
levar adiante o esforço de reestruturação produtiva. Ainda assim, vale
também nesse terreno a máxima "antes tarde do que nunca".
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