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Cabo eleitoral
Não é a primeira vez que
Lula apóia Chávez perto
de uma votação decisiva
na Venezuela: atitude é
péssima política externa
QUANDO A Venezuela está prestes a decidir se
corrobora o 18 brumário chavista, quando a
oposição ao caudilho de Caracas
cresce, legitimada pelas marchas
de estudantes, quando uma defecção abala a junta governista
do Palácio Miraflores, o presidente Lula decide defender a
"democracia" de Hugo Chávez.
A displicência verbal de Luiz
Inácio Lula da Silva não pode ser
invocada para justificar o afago
em seu colega venezuelano. Em
política externa, como em quase
tudo na vida, admitem-se deslizes ocasionais. Mas, quando o
desvio se torna freqüente, então
estamos diante de um padrão.
O presidente brasileiro já se
prestara ao papel de cabo eleitoral de Chávez no fim do ano passado, quando faltava menos de
um mês para a eleição em que o
venezuelano obteve o direito de
permanecer presidente até 2013.
O pretexto era inaugurar uma
ponte no país vizinho, mas a
campanha chavista não perdeu a
oportunidade de faturar em cima da generosidade de Lula.
Agora Lula volta à carga, a 15
dias do referendo em que os venezuelanos decidirão sobre a
reeleição ilimitada -ardilosamente inserida em pacotes de
bondades, como a diminuição da
jornada de trabalho, que terão de
ser votados em bloco. A mais recente contribuição do presidente brasileiro à mais recente campanha chavista foi lida pelo venezuelano num programa de rádio.
Chávez tem motivo para regozijo. Vinha de uma semana ruim,
em que seu hábito de insultar governantes provocara uma resposta dura do presidente do governo espanhol, José Luis Zapatero, e do rei Juan Carlos. Em relação ao "Por qué no te callas?",
do sábado em Santiago, a falação
desastrada de Lula na quarta em
Brasília foi o antípoda perfeito.
Desnecessário dizer que o presidente do Brasil deve evitar participações especiais em assuntos
de política interna de outras nações. A atitude de resguardo,
além de canônica, torna-se prudente quando se prenunciam
problemas de maior vulto com o
país vizinho. Chávez, que já deu a
largada para uma corrida armamentista regional, agora fala em
desenvolver energia nuclear para fins pacíficos, nos moldes do
programa iraniano (inclusive pela baixa credibilidade).
Lula não precisava ter-se embananado, evocando exemplos
de democracias parlamentaristas européias, a fim de defender
mandatos ilimitados para Chávez. Tampouco era o caso de sugerir a limitação do mandato na
Venezuela. O caso era de seguir o
enunciado do rei espanhol e
manter-se eqüidistante de algo
que será objeto de voto popular.
A defesa atabalhoada do cesarismo chavista, contudo, acabou
por revelar uma inconstância
preocupante de princípios no
Planalto. O círculo lulista não está convencido de que permitir o
terceiro mandato presidencial
seja algo fora de questão, na Venezuela ou aqui. Ora emite uma
mensagem, de olho em votações
importantes no Congresso, ora
verbaliza o seu oposto.
Em 2005, na outra vez em que
Lula elogiou por "excesso de democracia" o regime chavista
-referia-se aos plebiscitos, celebrizados por ditadores como
Saddam Hussein-, o brasileiro
afirmou que não poderia "fazer
as coisas que Chávez fez". O venezuelano era "mais jovem" e tinha "mais petróleo", argumentava. Que a descoberta do campo
Tupi não tenha subido à cabeça.
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