São Paulo, domingo, 18 de novembro de 2007

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TENDÊNCIAS/DEBATES

América Latina: à altura dos desafios

ANOOP SINGH

A América Latina vive a mais longa fase de crescimento econômico contínuo desde os anos 70. O Brasil destaca-se como exemplo de sucesso

ESTE ANO assinala um marco importante para a América Latina. Como mostra a nova edição do informe "Perspectivas Econômicas: As Américas do FMI", a região desfruta do mais longo período de crescimento econômico ininterrupto desde a década de 1970. Em relação a 2002, há mais 25 milhões de pessoas empregadas, enquanto 16 milhões foram alçadas de uma situação de pobreza com bons programas sociais.
O Brasil se destaca como exemplo de grande sucesso. Ao contrário de períodos anteriores, a atual expansão se caracteriza por elevados superávits em transações correntes e melhorias nos fundamentos econômicos.
Esses bons fundamentos são de fato razão essencial da resistência da América Latina, até agora, à turbulência financeira que começou em agosto. Houve certa volatilidade, mas, de modo geral, a região não se deixou abater pela crise do crédito "subprime" nos EUA, já que a exposição dos países a esse tipo de investimento é mínima e as oscilações nos fluxos de capital foram absorvidas pelo câmbio.
Isso não significa, naturalmente, que a América Latina esteja agora imune ao contágio. Nosso relatório mostra que a região continua altamente sensível a uma desaceleração global acentuada, ao aperto dos mercados de crédito ou à deterioração das relações de troca. Uma maneira de atenuar esses riscos é a consolidação e a ampliação das melhorias recentes nos fundamentos macroeconômicos.
A política fiscal é um exemplo. No ano passado, a região registrou superávits primários históricos, mas, em geral, os gastos públicos estão crescendo a um ritmo acelerado. Mantida essa tendência, a situação das finanças públicas estaria ameaçada. Cabe aos governos encontrar a forma de equilibrar investimentos sociais e de infra-estrutura com a necessidade de reduzir a dívida pública e a vulnerabilidade. Contas públicas ajustadas ajudam os países a absorver melhor a entrada de capitais e dar respaldo à política monetária.
Uma supervisão cuidadosa do setor financeiro também é fundamental.
No ano passado, o crédito ao setor privado cresceu em média 40%. No Brasil, os mercados de capitais também estão em rápida expansão, como ilustra a multiplicidade de emissões privadas de ações e títulos de dívida e aberturas de capital.
Considerando os baixos níveis de intermediação financeira na região, essa expansão não é necessariamente motivo de preocupação. Contudo, as turbulências recentes são um lembrete de que há um risco inerente em tentar ampliar uma carteira de crédito à custa de relaxar os critérios para a concessão de empréstimos.
Outra área crítica é a da política monetária e cambial. A região desenvolveu regimes de política monetária muito melhores nos últimos anos, que têm se mostrado flexíveis às mudanças nos cenários externo e interno. Todavia, em muitos países, há sinais claros de que a inflação começa a subir. Isso se deve, em parte, a fatores relacionados à oferta, como os aumentos nos preços dos alimentos e dos combustíveis, mas também é um sinal de um ambiente de crescimento vigoroso. Essas tendências inflacionárias têm de ser cuidadosamente monitoradas.
Nesse contexto, as moedas de vários países, incluindo o real, se valorizaram. Isso é, em parte, resultado da fragilidade do dólar, mas também é um sinal de prosperidade econômica.
No Brasil, por exemplo, o fortalecimento do real está sendo acompanhado pelo crescimento dinâmico das exportações. É claro que uma moeda mais forte implica alguns custos de transição, mas também reforça a importância de promover avanços em outras frentes para aumentar a produtividade e o investimento.
Em resumo, a região vem apresentando bons resultados, e as turbulências recentes mostram que a América Latina é hoje mais resistente a choques do que no passado. Além do mais, a economia mundial ainda cresce a um ritmo vigoroso, os preços das commodities estão em alta e os fluxos financeiros beneficiam a região.
Porém, é pouco provável que o ambiente seja sempre favorável e deve-se aproveitar a ocasião para identificar e solucionar as vulnerabilidades.
Ao mesmo tempo, cabe aos países manter o foco na promoção do crescimento, com expansão do investimento e aumento da produtividade, o que ajudará a consolidar os ganhos na batalha contra a pobreza e as desigualdades sociais.
O Fundo Monetário Internacional continua empenhado em contribuir para esses esforços, prestando assistência técnica e assessoria na formulação de políticas econômicas apropriadas para lidar com essas questões.


ANOOP SINGH, 57, é diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI (Fundo Monetário Internacional).

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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