São Paulo, sexta, 18 de dezembro de 1998

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O IMPEACHMENT E O GOLFO

O Iraque está sendo submetido a um intenso bombardeio, pela primeira vez desde a Guerra do Golfo. Estados Unidos e Grã-Bretanha promovem o espetáculo. A decisão de desencadear a operação seguiu um roteiro bem diverso do de 91, quando uma ampla coligação de países engajou-se no bem-sucedido esforço militar que expulsou do Kuait as tropas invasoras de Saddam Hussein.
Dessa vez, no entanto, não houve nem sequer o sinal verde do Conselho de Segurança da ONU -bem ou mal, a instância diplomática que opera os difíceis consensos da comunidade internacional. Seus integrantes permanecem divididos. Uma das conclusões possíveis, em meio a uma controvérsia jurídica, é a de que norte-americanos e ingleses assumiram por conta própria uma missão para a qual não tinham mandato.
Seria um precedente delicado, perigoso e por isso mesmo condenável.
É evidente, ao mesmo tempo, que equipes de inspetores da ONU enfrentaram seguidas vezes obstáculos por parte do governo iraquiano, ao tentar verificar instalações de produção e armazenamento de armas químicas e biológicas. Há poucas dúvidas de que Saddam Hussein procurou esconder arsenais de destruição, abertamente vedados pelas convenções internacionais.
É bem do estilo desse ditador -dificilmente se saberá ao certo quantas milhares de mortes de curdos, xiitas ou opositores ele acumula em seu currículo-, patrocinador de um projeto belicista e hegemônico sobre seus vizinhos da Ásia Menor.
Mas o problema não está apenas na maneira praticamente unilateral com que o governo dos Estados Unidos procura agora neutralizá-lo. Está também no instante escolhido para fazê-lo. A decisão de disparar sobre Bagdá a primeira bateria de mísseis foi tomada por Bill Clinton quando a Câmara já havia agendado a votação de sua destituição da Presidência.
Bem mais que mera coincidência, há nisso um forte indício de que, com a ação militar, o presidente norte-americano armou um cenário cinematográfico para desviar a atenção sobre sua difícil situação interna. Seria algo capaz de macular até mesmo um resultado militar concreto contra o regime iraquiano.



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