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ANTONIO DELFIM NETTO
Econometria e "achismo"
O professor Dionísio Dias Carneiro publica mensalmente a
"Carta Econômica Galanto", em que
analisa os problemas brasileiros com
competência e objetividade. O que
tenta, mensalmente, é dar uma estrutura óssea palpável à teoria econômica
utilizando os dados da realidade brasileira. Todos sabemos que a utilização de técnicas econométricas é sempre praguejada de problemas metodológicos, mas, mesmo assim, é sempre mais útil e melhor utilizá-las em
lugar do puro "achismo", que é a praga que assalta alguns analistas. Uma
coisa é afirmar apoditicamente que as
variações da taxa Selic não têm nada a
ver com as taxas de inflação futura e,
com "natural auto-suficiência científica" -amplamente reconhecida-,
dispensar a necessidade de qualquer
prova. Outra coisa bem diferente é
tentar verificar seriamente se os dados
da realidade brasileira são compatíveis com tal assertiva.
No número de janeiro de 2003 da
"Carta Econômica Galanto", o professor Dionísio e o excelente economista
Thomas Wu enfrentam o problema
da utilização da taxa de juros Selic para o controle da demanda global da
economia e, consequentemente, da
taxa de inflação futura. Utilizam um
modelo extremamente simples. Teoricamente, as manobras da taxa Selic
são feitas para modificar a taxa de juro
real, que se obtém dividindo a taxa Selic pela "expectativa" de inflação. É a
variação da taxa de juro real que modifica a disposição dos consumidores
e dos investidores. A modificação da
demanda global (a taxa de variação do
PIB) é, assim, ligada, pela variação do
consumo e do investimento, à taxa de
juro real. Quanto maior (menor) a taxa de juro real, menor (maior) a taxa
de crescimento do PIB.
A estratégia de Dias Carneiro e Wu
para "medir" esse efeito foi construir
uma série do crescimento trimestral
do PIB (1995:1 a 2002:4) e tentar "explicá-lo" usando o crescimento do PIB
nos dois trimestres anteriores, a taxa
de juro real no trimestre anterior e
uma engenhosa variável que sugere
como se movem as expectativas quando se altera a taxa de juro real. Eles deram a essa variável o valor um nos trimestres em que o juro real aumentou
e zero nos trimestres em que a taxa de
juro real diminuiu.
Tomando as 32 observações dos dados trimestrais do PIB, chegaram à
conclusão de que, com aquelas quatro
variáveis, se pode explicar três quartos
dos resultados, indicando claramente
que existe uma relação entre elas. Um
dos resultados mais interessantes é
que a variável "engenhosa" mostra
que, quando a taxa de juro real aumenta (não importa quanto) no trimestre, isso reduz em 1,3% a taxa de
crescimento trimestral esperada do
PIB. O efeito da variação de 1% do juro
real num trimestre é o de reduzir em
0,5% o crescimento do PIB no trimestre seguinte.
O estudo confirma a importante sinalização das modificações na taxa de
juro real sobre as "expectativas" de
consumidores e de investidores
-mesmo quando elas são relativamente pequenas. Esse resultado dá
significado ao aumento tão criticado
de 0,5% na taxa Selic em janeiro. Como todo trabalho econométrico, este
também tem suas dificuldades, mas é
impossível deixar de reconhecer que
ele é bem melhor do que o "achismo",
tão em voga entre nós.
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br
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