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VINICIUS TORRES FREIRE
Preguiça "desgramada" e outras gafes
SÃO PAULO - Para as crianças, ler é tão desanimador como as caminhadas para os adultos sedentários: "dá
uma preguiça "desgramada'", disse o
presidente Lula da Silva ao inaugurar a Bienal do Livro de São Paulo.
Lula não lê mais de duas páginas
de relatórios, dizem assessores, gosta
de piscina, churrasquinho, pelada e
música sertaneja, samba, suor e cerveja. Não deixa, pois, de ter razão o
realismo pedestre de Lula sobre a leitura. Preconceito? Não é o caso.
O presidente não é deus, como alertou, mas gosta de ser a voz do povo,
um megafone de hábitos, trejeitos,
preconceitos, utopias e até sabedorias
populares. Tanto faz, a princípio, que
Lula seja assim. O problema é que ele
não consegue transcender seu realismo pedestre a fim de desempenhar o
papel público de presidente, de transmitir uma visão mais racional e elaborada sobre as questões públicas. Limita-se às metáforas chãs, tem amor
pelas mezinhas, pelas alegorias da vida de peão, sobre o companheiro que
leva bronca da patroa por ter parado
no botequim para a cervejinha.
Esse bestiário da vida operária não
dá conta do debate democrático, o
metaforismo popular não é capaz de
traduzir questões de governo para o
povo pobre. É apenas demagogia, talvez não intencional: Lula é o que parece ser. Transmite seus preconceitos
sem pejo ou mesmo consciência do
que faz, como no caso da gafe sobre a
leitura e tantas outras.
Depois de tal gafe, veio o complemento habitual dos discursos de Lula: tal e qual problema é grave, mas
"temos de ter políticas", no caso "para garantir que a criança adquira o
prazer de leitura". Tal como um Policarpo Quaresma ou um Quincas Borba operários, Lula tem espasmos freqüentes de palanquismo salvacionista, de criar emplastros cura-tudo, de
planos para redimir a república.
Já vimos os falidos Fome Zero, Primeiro Emprego, bolsa-fogão e tantos
outros. Agora, Lula quer criar frentes
de trabalho, engajar recrutas para
dar-lhes uma profissão para a qual
não haverá emprego. Quando Lula
convocará os sem-terra para construir pirâmides keynesianas?
Isso é Lula, apenas um homem só.
Mas que país é esse em que um governo tanto pode ser a encarnação dos
modos desse homem?
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