São Paulo, quarta-feira, 19 de abril de 2006

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SEM MOTIVO PARA LENTIDÃO

A denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, que implica 40 pessoas nos desmandos do mensalão é uma peça atípica a aportar no Supremo Tribunal Federal. Não é todo dia que a corte máxima é chamada a deliberar sobre uma peça criminal -com tal escala e tal apelo- desde o seu estágio inicial. Na conta do primeiro impacto diante desse certo ineditismo deve ser debitada boa parte das declarações em tom de desabafo de Joaquim Barbosa, o ministro a quem cabe a relatoria do caso.
O magistrado atacou o foro privilegiado, que estabelece o STF como instância para julgar ações penais contra deputados, senadores, ministros de Estado e o presidente da República. O dispositivo seria, em suas palavras, "uma excrescência tipicamente brasileira". O Supremo, disse Barbosa, não tem estrutura nem vocação para lidar com denúncias como a oferecida por Fernando de Souza. Uma provável demora na tramitação do processo, argumentou, deverá ser imputada ao foro privilegiado.
A eleição de uma corte graduada para julgar autoridades públicas, porém, não é empecilho à tramitação ágil da denúncia do Ministério Público. Pelo contrário, o fato de a ação iniciar-se já na corte máxima torna o processo potencialmente mais rápido do que se fosse proposto na primeira instância -o que sempre multiplica as possibilidades de protelação até que o caso transite em julgado, em geral no próprio Supremo.
Tampouco os problemas de estrutura alegados por Barbosa parecem incontornáveis a ponto de atuarem como fator de atraso. Um juiz do STF decerto tem mais e melhores funcionários a seu dispor do que um magistrado de primeira instância; além disso, o ministro-relator tem a possibilidade de delegar algumas funções do processo no intuito de agilizá-lo.
O argumento de que o Supremo teria de se debruçar apenas sobre processos de grande repercussão constitucional -e não atuar como corte criminal- pode fazer sentido para repelir outros casos, mas não a denúncia acerca do mensalão. Não há ação cujo julgamento hoje seja mais importante em termos políticos e institucionais do que essa proposta pelo procurador-geral da República.


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