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Mais que uma sigla
Membros do Bric têm grandes diferenças entre si, mas interesses comuns podem impulsionar acordos vantajosos
NADA É tão irresistível
como a força de uma
ideia cujo tempo chegou, disse Victor Hugo. Assim é com o bloco designado pela sigla Bric (Brasil, Rússia,
Índia e China), criada em 2001.
Nos anos 1980 já havia o conceito de "países baleia", que elegia massa territorial e demografia como elementos críticos para
o protagonismo global.
Mas ainda não era o tempo
-existia a URSS, a China havia
apenas iniciado sua abertura, o
Brasil patinava na hiperinflação
e a Índia padecia nas ineficiências de seu modelo.
Nesta década, a ascensão da
China como plataforma manufatureira barateou os bens industriais e elevou os preços das matérias-primas. Foi um choque favorável para o mundo em desenvolvimento, que viu diminuída a
histórica escassez de capital para
investimento.
Nos últimos anos, os quatro
países concentraram mais de
50% do crescimento mundial,
receberam volumes crescentes
de investimento e desempenharam papel relevante nas questões globais.
Daí não resulta, contudo, que
formarão um bloco a atuar em
uníssono. Há convergência em
alguns temas, em especial o da
reforma financeira global, que
deverá evoluir, ainda que lentamente, em favor dos emergentes.
Mas as diferenças são muitas, e
cada um atuará em consonância
com seus projetos nacionais.
Brasil e Índia são democracias,
ao passo que Rússia e sobretudo
China são regimes autocráticos.
Exceto o Brasil, os outros três
são rivais estratégicos no xadrez
geopolítico asiático e global.
Não há, tampouco, um modelo
econômico a uni-los. A China se
consolida como potência industrial, num regime de capitalismo
dirigido pelo Estado. Brasil e Índia são economias de mercado
diversificadas, com forte consumo interno, mas baixa eficiência
produtivo-exportadora. Já a
Rússia encontra obstáculos para
reduzir a dependência do setor
de energia.
As divergências são claras no
âmbito da Organização Mundial
do Comércio. O Brasil é adversário, por exemplo, do protecionismo agrícola, ao contrário de China e Índia. Na questão climática,
o governo brasileiro mostra-se
mais compromissado em limitar
emissões de carbono.
A segunda reunião de cúpula
do Bric, realizada na semana passada, mostrou que nos temas
multilaterais é difícil ir muito
além de declarações de intenção.
Mas seria um erro acreditar
que o encontro é mera peça de
marketing. No plano bilateral, o
documento assinado por Brasil e
China, embora vago, é passo importante para oportunidades
equilibradas de comércio e investimento. A intenção de colaboração entre bancos nacionais
de desenvolvimento também é
positiva, pois permitirá diversificar fontes de financiamento.
Esse tipo de cooperação na
agenda do desenvolvimento é
um fator real de aproximação
entre os quatro países, que poderá contribuir gradualmente para
maior convergência nos grandes
temas globais.
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